sábado, 15 de maio de 2021

GAITA DE PENTE

 

Praia da Ribeira (Arquivo JRS)


         Bartolomeu, o "Baiano", era baiano mesmo! Veio parar em Ubatuba no segunda metade da década de 1960. Trabalhava de ajudante, era "pião de obra". Naquele tempo, muitas construções estavam surgindo pelas praias.  Assim, os primeiros migrantes deram a sua contribuição, fizeram a população do município dobrar a cada dez anos, segundo os dados do IBGE. Na década de 1990, graças à internet, Bartolomeu pôde ser resgatado por seus familiares de Pilão Arcado, na Bahia. Foi passar o resto da sua vida em sua terra natal, junto aos seus. Mas por que comecei a história de hoje com ele?

        Quando eu conheci o Bartolomeu era o ano de 1970. Ele bebia bastante, alcoólatra, fazia parte da "Roda da Cachaça", um grupo assim nomeado no Perequê-mirim. De vez em quando seus integrantes eram convidados do papai para comer peixe assado, beber e prosear no terreiro onde morávamos. Para nós, crianças, Bartolomeu era a atração quando sacava um pente do bolso, pedia um pedaço de papel e se punha a tocar melodias na gaita de pente. Maravilhoso aquilo!

       O tempo passou, nós crescemos e a maioria daquele  pessoal, amigos do meu pai, já se fora antes do combinado. No ano de 1991, indo pela trilha das Sete Fontes, me detive na casa do Birinha, na praia da Ribeira para uma visita a ele e às irmãs que estudaram comigo no "Deolindo", o único colégio na época. Depois de um café de garapa, ele me acompanhou até o canto da praia, no recomeço da trilha. O meu plano era almoçar com a Mercedes e o Agnelo, em Sete Fontes. Ficou no plano. Só no plano! É que mais adiante, no começo do morro, debaixo de uma jaqueira, estava alguém tocando. Adivinha o quê? Uma gaita de pente! Ali nos detivemos para escutar aquela maravilha. Que surpresa! Era o Toninho Preto, um dos remanescentes da "Roda da Cachaça". Me deu um forte abraço assim que me reconheceu. Após o Birinha retornar aos seus, eu fui convidado por Toninho a ir até onde ele estava morando. "É aqui que eu me escondo há mais de 10 anos. Estou de caseiro aqui". Pela primeira vez eu pisei na prainha da Dionísia. Duvido que muita gente a conheça, tenha ido lá. Aí não teve como não almoçar com ele e a esposa e passar o resto do dia proseando e escutando a gaita de pente. Me lembro bem dos pedaços de papel de seda previamente cortados, dentro de um samburá sobre o banco. De vez em quando ele descartava um que estava molhado demais, atrapalhando o som. Que coisa boa rever gente nossa e recordar bons momentos em nossas vidas! Na saída, com os olhos marejados, nos despedimos. No portão, na saída da propriedade, após abraçar o casal, esta foi a frase do Toninho e da Zizi: "Vai com Deus, 'Carpinteirinho'. Dê lembranças nossas ao velho Carpinteiro". Era noite fechada quando cheguei no ponto de ônibus, no Saco da Ribeira.

             


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