domingo, 28 de janeiro de 2024

É GENTE NOSSA!

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  •  Arquivo R. Ferrero 


  •       Adoro ouvir histórias,  sobretudo quando elas transmitem aspectos da resistência da cultura caiçara. O texto a seguir é do estimado Roberto Ferrero, da praia da Enseada.  Gratidão, irmão. 

  •   Em 2014, um grupo de amigos deu o ponta pé inicial na @aarcca_ubatuba. É uma associação com o objetivo de fomentar a cultura caiçara na região através da corrida de canoas, que já ocorria de forma espontânea em algumas comunidades de Ubatuba. O primeiro desafio foi mapear todas comunidades que realizavam a festa ou aquelas que deixaram de realizar. Entender os gargalos e dificuldades de cada uma para traçar um plano de ação. Era muito legal ver o empenho de cada comunidade e a vontade de outras em participar. Teve ano que tinha corrida até duas vezes por mês! Mas também era muito difícil encontrar um plano que contemplasse todas comunidades, que tem realidades diferentes entre si. Foram inúmeras reuniões e desgastes! Uma década de luta se completa esse ano, muito legal ver onde chegou!
  •     Na foto Juarez e Eu, numa barraquinha que arrendamos na Caiçarada para vender bolinho de arraia e tainha frita para arrecadar fundos para a associação! E tempo!

segunda-feira, 8 de janeiro de 2024

POUCAS VEZES FOI SORTE...

 




   Avisto uma coisa sobre a mureta, me aproximo. Vejo que meu sobrinho faz o mesmo. "Que é isso, tio?". Seguro aquela delicadeza na mão, peço a ele que tente adivinhar.    "Não sei, mas parece um osso". Confirmei e expliquei: "É um osso,  do peito do frango. O povo caiçara, a nossa gente mais antiga o nomeia como osso jogador. Na verdade,  este título  se justifica porque ele era recurso para encerrar disputas, concluir apostas etc.". Notando que o jovem ainda não compreendera quase nada, fiz uma demonstração. Segurei uma haste do ossinho e pedi que ele fizesse o mesmo do outro lado. "Tá firme aí? Agora vamos apostar: quem perder lavará toda a louça que lota a pia. Tá bom assim?". Ele concordou mesmo sem ter captado toda a lógica. Eu continuei: "Segura bem  na ponta usando o polegar e o indicador. Vou contar até três.  Aí puxamos estas perninhas do osso. Quem ficar com a maior parte é o vencedor. Lá vai: 1...2...3!". Adivinha quem teve um monte de louças para lavar?

  São detalhes assim, aparentemente insignificantes, que se compõem,  resultam numa cultura. Cultura é cultivo. Se a gente não cultivar...Onde vamos parar?

terça-feira, 2 de janeiro de 2024

SEJAMOS BOM FERMENTO

    

Arte em casa - ano JRS


       Novo ano. Fui no fim da tarde buscar umas mudas de roseiras na horta do Francisco. Admirei galinhas, galos e patos pelo caminho.  Tudo em paz. Só um cretino ainda soltava fogos para perturbar os cães. Assim que cheguei o meu amigo perguntou: "Está com tempo, Seo Zé? Vamos comigo recolher os animais para dormir?". Topei prontamente. Afinal, essa rotina de cuidar de gado não faz parte da minha história. 

     Lá fomos nós na direção do pequeno pasto, onde quatro vacas pastavam. Logo os animais notaram a nossa chegada. Devem ter se perguntado: "Quem é aquele que segue o nosso dono?". Francisco comentou algumas coisas, indicou o alto do morro onde a sua filha está construindo uma linda casa. Imagino  a maravilhosa visão que se tem de lá. De repente o meu  amigo fala bem alto: "Vamos embora, pessoal . Tá na hora de dormir". Vocês não imaginam  a minha surpresa quando,  imediatamente,  as vacas tomaram o caminho da casa, foram em direção ao cercado delas. Resumindo: entenderam perfeitamente a mensagem de Francisco, tal como outro Francisco muito famoso. E obedeceram!

     Feliz daquele que tem a segurança de um abrigo, uma casa para voltar após um período de labuta. Por isso é crime expulsar os pobres de suas terras.  Por isso é crime negar pátria a um povo.  Por isso é desumano tanta gente sofrendo pelas ruas,  enfretando as intempéries,  comendo dos restos que encontram nas lixeiras.

    Que neste ano novo as boas mensagens entrem em nosso ser e ser tornem bom fermento  no mundo.