quarta-feira, 22 de maio de 2013

UM ITALIANO QUE AMOU UBATUBA


                
Igreja Matriz de Ubatuba (Arquivo JRS)
                Helena Silveira: seja bem-vinda!

          De vez em quando eu recordo de algumas passagens a respeito do saudoso Frei Pio Populin, sobretudo de embates com o finado João Pimenta, da praia do Sapê, onde nasci. Era interessante escutar uma espécie de prosa que não era comum em nosso meio. Hoje eu digo que tratava-se de enfrentamentos teológicos. Quando? Segunda metade, quase final da década de 1960. A imagem do disposto religioso escondido por um hábito marrom, tendo um cordão encardido pela cintura, foi marcante na minha infância. Bem depois disso, já na década de 1980, na Estufa, lá estava eu ajudando o mesmo frei nas obras da futura Creche Francisquinho. Também estive com ele me inteirando do Posto da ASEL, na Praia da Ponta Aguda. Deste lugar estão na memória: Aristeu, Odócia, João Araújo, Ambrósio, Filhinha e tantas pessoas desta terra (Ubatuba) maravilhosa!
                Agora, relendo a tese de doutorado do Olympio Corrêa de Mendonça, defendida em 1978, novamente sou instigado a escrever a respeito do Frei Pio.

                A instabilidade social da região dificulta muito o levantamento estatístico do número de suas casas e seus habitantes. A transformação causada pelas obras da Rio-Santos, a especulação imobiliária, a presença de potentes barcos de pesca nesse litoral e a proibição da caça de subsistência têm estimulado o êxodo para as cidades. O Bairro da Estufa, em Ubatuba, tem recebido um enorme contingente de famílias de retirantes. Em Ubatumirim, porém, onde se instalou uma missão franciscana, o êxodo rural é menor. Há casos, inclusive, de famílias que mudaram para Ubatuba, gastaram o dinheiro da venda de seus terrenos, e depois voltaram para a região, internando-se nos sertões do sopé da Serra do Mar, para formar novas posses, onde lavrariam a terra, beneficiariam a mandioca, e dedicar-se-iam à caça de subsistência, únicas atividade para as quais estão preparados.
                [...] De 1970, quando começou o desmatamento para a construção da estrada de serviço [dando início à rodovia que nos ligaria à vizinha Paraty],  até hoje, quando o asfalto corre por vales, corta morros, aterra mangues e já está para se encontrar com o trecho que vem de Santa Cruz (R.J), e as autoridades prometem a inauguração do trecho Ubatuba a Santa Cruz, para meados de 1976, a região já sente os sintomas e as consequências de uma transformação radical. Junto com o desenvolvimento chegou a destruição. [...] O caiçara antes já abandonado, recebe agora o tiro de misericórdia. As pressões econômicas, físicas, psicológicas, despojam-no de suas posses seculares (Ver SEMEDO, Fernando. “Rio-Santos ameaça tudo, até os caiçaras”. O Estado de São Paulo. São Paulo, 29 out., 1973). Os terrenos chegam a ser vendidos por centímetros. É a Costa do Ouro Brasileira; não há lugar para os que a lavraram durante cerca de 300 anos.
                Os caiçaras expulsos das terras de seus ancestrais, são apertados nos sertões dos sopés da Cordilheira Atlântica, tornam-se, mais raramente, caseiros de suas próprias terras, já vendidas a preço baixo, e, no mais das vezes, são jogados às sarjetas das cidades vizinhas, que se incham nas favelas, que já começam a proliferar pelos mangues e morros.
                [...] Se não tivesse existido o esforço ingente da Ação Social Estrela do Litoral (ASEL), dos Frades Conventuais, talvez esse “Império Caiçara” já estivesse totalmente devastado.
                Frei Pio Populin, missionário franciscano conventual, chegou a Ubatuba em 1967. Seus primeiros contatos com os caiçaras são narrados por Stipp Junior:

                “... no meio dos turistas, sua atenção foi atraída por aquela gente simples e pobre que chegava pelo mar, com sacos de farinha ou cachos de banana para vender...”

                E Frei Pio embarcou-se numa daquelas canoas feitas de um só tronco e penetrou no chamado “Império Caiçara”. Mais tarde, vencendo dificuldades enormes, instalou em Ubatumirim, no coração da região, o Centro de Promoção Humana e Profissional, mantido pela ASEL da qual é fundador e presidente.

                Sei dos esforços do Frei Pio. Meus tios Salvador, Nelson e Dito Félix estiveram na empreitada do Estaleiro do Padre. Ele, imitando o Santo de Assis, também saía pedindo até mesmo junto aos empresários no ABC e na capital paulista. Agora, descansa neste chão que tanto amou, bem longe da pátria italiana. 

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