quarta-feira, 27 de março de 2013

ERA ASSIM MESMO


Olha aí a mardita, a branquinha cobiçada! (Arquivo JRS)


    Num dia desses, em conversa com o meu pai bem cedinho, num café regado com farinha e abacate, perguntei das suas lembranças a respeito da Fazenda Velha, dos Irmãos Chiéus, onde fabricava a pinga Ubatubana. Ah! Ele divagou em sua infância distante! Ficou emocionado. Afinal...

  “A primeira vez que eu passei por aquele caminho faz muito tempo. Devia ser o ano de 1945; foi junto com o papai. Ainda morávamos na Praia do Pulso. Eu tinha oito ou nove anos, se não me engano. Saímos antes do dia amanhecer, com uma carga de quarenta alqueires (vinte e cinco quilos) de farinha de mandioca. A distância de lá até o centro da cidade é de 27 quilômetros. Era uma quantidade produzida a mais para vender em algum armazém, acho que do Teixeira Leite. O dinheiro sempre voltava em forma de mercadorias que a gente precisava naquele tempo (sal, querosene, arroz, óleo, fósforo...).
 Você imagina essa distância, com uma carga de farinha? Para a viagem, ainda me lembro muito bem, na  véspera, à noite, a mamãe preparou uma comida. A mistura foi ouriço assado. A nossa parada para comer foi ali na descida do Morro da Berta, no Poço da Onça. Ainda tem lá aquela água gostosa! Depois, descendo um pouco mais, já era a Fazenda dos Irmãos Chiéus, onde todo mundo parava para conversar um pouco, tomar um gole de pinga e terminar o trecho até a cidade. A cachaça era cortesia deles; um agrado para os caminhantes.
 Na cidade, fizemos o que era preciso fazer. Já era na metade da tarde e eu estava muito cansado. Era criança, né? Então fomos para a Estufa, na casa da tia Sebastiana, onde dormimos e descansamos bem para fazer, no dia seguinte, o mesmo caminho de volta. Novamente o papai levava uma carga de compra. Era tudo a pé. Só quando o mar estava manso é que era possível fazer um pedaço dessa distância de canoa. A gente vinha remando desde o Pulso até o canto de cá da Lagoinha. Era dificultoso? Se era! Mas quando não se tem facilidade, a dificuldade é coisa normal, quase não se sente”.

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