domingo, 15 de janeiro de 2012

“No princípio era um carreiro. Ele ficava na encosta”



               Ao ter conhecimento dos caminhos de servidão, o amigo Jorge, se reportando ao tempo que morava na capital paulista, citou as estradas de servidão ainda existentes e assim conhecidas pelos paulistanos. Depois disso eu fiquei refletindo que, talvez, estrada (de servidão) fosse uma denominação mais adequada para interligações mais distantes, tal como as intermunicipais na atualidade. Seguindo este raciocínio, as ligações do nosso município com as “localidades de Serra Acima” seriam estradas de servidão. Assim, teríamos as tais estradas desde a que ainda hoje é usada no Sertão da Quina (que dá acesso à Vargem Grande)  até a denominada Trilha do Corisco, que parte do Sertão da Fazenda da Caixa e termina em Paraty. Entre estas, teríamos a do Corcovado e a da Cachoeira dos Macacos, ambas, assim como a primeira citada, terminam na Vargem Grande. A outra bem desconhecida é a da Escorregosa (que faz a ligação com Cunha). A questão é: por que a convergência à Vargem Grande? A resposta é simples: era o ponto de chegada do Carreiro das Antas, um dos acessos dos índios (tupinambás) ao planalto. Foi sobre esse trajeto que os portugueses determinaram a primeira interligação de Ubatuba com a Serra Acima, conhecida hoje como a Trilha dos Macacos. De acordo com tradição oral reproduzida por Dito Chiéus, o ponto de chegada desse acesso era a fazenda, dentro da área da Estação Experimental do Horto Florestal. Só mais tarde, já no Segundo Império, o caminho sofreu novas mudanças que corresponde ao traçado aproximado da atual estrada (trecho de serra da rodovia Oswaldo Cruz). Vale apena conferir!
            Entre alguns cronistas há a suposição de que, por esse carreiro, uma porção dos índios confederados alcançou a Vila de Piratininga. A outra parte galgou a Serra do Mar a partir do caminho do rio Juqueriquerê, em Caraguatatuba. O estratagema seria: atacar os perós, depois fugir atraindo-os à desembocadura do Quiraré, onde o grosso da Confederação dos Tamoios aguardava. Deu certo. Basta recorrer às palavras de Anchieta acerca do combate, onde os portugueses e seus aliados “apanharam feio”:
            “A custo percebeu finalmente (Fernão de Sá) que os seus  desertaram, enquanto  ele   mergulhava na turba, inebriado de sangue, olhos na derradeira vitória.   Ao ver-se  abandonado, entre os inimigos, com poucos companheiros, entendendo ser inútil lutar contra tantos, retira-se dos arraiais e pouco a pouco recua na direção do rio, para    entrar com seus bravos nas barcas que aí estariam presas. Mas, aí, covardes,   menosprezaram as ordens e a vida do chefe e largaram para longe da margem a  armada, cedendo a um temor vergonhoso”.
            Na verdade, agora quem conclui é Aylton Quintiliano, na obra A guerra dos Tamoios:
            “Fernando de Sá, abandonado pelos seus, é liquidado com os que ainda ficaram ao seu lado, pagando com a vida tanto sangue tamoio derramado”.
            De tudo isso, podemos deduzir que é possível a mudança de nome de carreiro para estrada de servidão. E, os acessos curtos, no território da freguesia, tornaram-se caminhos de servidão.
            O que podemos fazer é sair em defesa dos caminhos e estradas de servidão. Afinal, são componentes do nosso patrimônio histórico e cultural.

Um comentário:

  1. Professor, ótimo trabalho de preservação a nossa cultura e história, o povo caiçara merece mesmo esse reconhecimento.
    Só queria saber porque o senhor não comentou sobre esse blog na sala de aula.

    Abraços, Lucas Gustavo. Ex. 2ª Semíramis

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