segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Cavalo Grande

                Para entender melhor o que eu vou escrever, você precisaria conhecer o Saco dos Morcegos, o local da fazenda de Sinfrônio Antunes de Sá, “a raiz dos Madalenas”. Na fotografia, eu faço questão de mostrar a pedra de moinho que resiste junto a algumas colunas. É do “Porto da Fazenda”, olhando para a costeira do lado esquerdo, que se enxerga uma pedra enorme, com uma declividade impressionante. Garanto aos puladores de pedra que, ao chegar nela, só existem duas alternativas: cair no mar e sair nadando ou subir a mata para caminhar aproximadamente os cinquenta metros daquela pedra. Esse lugar é conhecido como Costão do Cavalo Grande.
                Os antigos moradores daquele local (Dito Madalena, Neco, Constantina, Palmira, Gregório, Teólfilo, Dominguinhos...), ainda parentes meus, me explicaram a história do lugar, o porquê do nome do costão. Disseram que foi por causa de um acidente no início do século XX, quando um grande mestre de canoa de voga perdeu a vida no mar.
                José Vieira Serpa, navegante ubatubano de tradição, era considerado o melhor mestre nas viagens entre Santos, Ubatuba e Angra dos Reis. Além dos conhecimentos técnicos, também conhecia muito do tempo, das condições para a navegação. Além disso,  “pressentia coisas de longe”. Dele partia a comando sobre os oito tripulantes da grande Cavalo Grande, a canoa de voga que entrou para a história com uma tragédia.
                As canoas imensas eram importantíssimas num tempo onde o mar era a nossa principal via de acesso às cidades litorâneas vizinhas. É preciso lembrar que a rodovia existente entre Ubatuba e Caraguatatuba é de 1950?
                Existiam embarcações maiores, feitas em estaleiros, mas tinham pouca praticidade aos pequenos empreendedores porque seguiam um calendário determinado, paravam em vários portos, etc. A solução era canoa de voga, “feita de um pau só”. Dizia o vovô Armiro, remador admirável, que muitas dessas canoas eram conduzidas por oito tripulantes e um mestre, mas tinha aquelas de seis tripulantes, um pouco menores. Eram nos bancos que, completamente esticados, os homens descansavam enquanto tocavam os ventos favoráveis no traquete e na mesena. Imagine a largura dessas tais canoas! Até uma caixa de areia, onde era montado um fogão de tacuruba, fazia parte do lastro da embarcação. “Era para fazer um café, preparar uma comida rápida. Desse jeito ninguém desembarcava e a viagem rendia mais”.   
                Numa de suas viagens, o reconhecido mestre aportou na Ilhabela e mandou reforçar nas poitas porque tudo indicava uma tormenta forte se preparando para chegar. Ao saberem que teriam de pernoitar naquele local, distante de suas casas, correndo o risco de perder uma festança na cidade natal, os tripulantes começaram a atazanar o Zé Vieira. Foi tão grande a encheção de saco, que o homem perdeu a paciência, levantou as poitas e rumou ao destino. Os ilhéus contam que, ao embarcar contrariado, assim expressou o competente mestre canoeiro: “Eu morro, mas vocês também não ficam para contar história”. Depois disso, somente os destroços encontrados a partir do Saco dos Morcegos até Angra dos Reis tentaram revelar o ocorrido. Todos morreram.
                Então é isto: o costão tem esse nome porque por ali encalhou um pedaço da canoa de voga Cavalo Grande, que navegava sob as ordens de grande mestre José Vieira Serpa.

Um comentário:

  1. OBRIGADO POR MANTER VIVAS AS NOSSAS HISTÓRIAS.
    EU JÁ CONHECIA ESSA DA CANOA DE VOGA CAVALO GRANDE MAS NÃO ME CANSO DE LER, ACHO MUITO LEGAL.
    MEU PAI SENHOR (BENEDITO HENRIQUE DOS SANTOS FILHO), FALECEU A SEIS ANOS ATRÁS COM OITENTA ANOS, ME CONTAVA MUITAS HISTÓRIAS DE UBATUBA E EU LEMBRO COMO SE FOSSE HOJE, FICAVA OUVINDO SEMPRE ATENTO, IMAGINANDO COMO ERA ANTIGAMENTE.
    ELE MOROU NA ILHA ANCHIETA NA ÉPOCA DO PRESIDIO DOS NOVE ANOS AS DOZE ANOS DE IDADE COM SEU PAI. IMAGINE O QUE ELE ME FALOU, TEVE UMA VEZ QUE COMPREI AQUELE LIVRO QUE VENDE NA ILHA SABE QUE FALA DA REBELIÃO QUE TEVE LÁ PARA LHE PRESENTEAR, AI ELE ME DISSE NÃO PRECISO DE LIVRO EU SEI TUDO OQUE ACONTECEU LÁ, RSRSRSSRS.
    HOJE MORO EM SÃO PAULO, MAS MINHA FAMÍLIA TODA AINDA MORA NA PRAIA DA ENSEADA MINHA MÃE E TRÊS IRMÃOS, MAS TODO MÊS APAREÇO POR LÁ PRA TOMÁ AQUELE CAFÉ COM A FÁMILIA.
    SE O SENHOR FOR CAIÇARA DA TERRA DEVE CONHECER MINHA FAMILÍA.
    MAS UMA VEZ,OBRIGADO JOSÉ RONALDO POR MANTER NOSSAS TRADIÇÕES VIVAS.
    ATENCIOSAMENTE: BENEDITO HENRIQUE NETO.
    neto.ubatuba114@hotmail.com
    ABRAÇOS...

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