domingo, 13 de dezembro de 2020

FARRA DE CAUSOS (XIV)

 

Maria Aiuruoca (Arquivo JRS)

        MEDO DE APANHAR

    Quando eu era pequena só pensava em brincar o tempo todo. Era uma criança que vivia pelo mato em busca de aventuras. Certo dia, ouvi meu tio dizer que embaixo de uma árvore havia um filhote de urubu. A curiosidade foi grande e saí à procura do animal. Ao encontrar o bicho, peguei e levei para casa. A mãe do bichinho foi atrás dele e ficou voando o tempo todo sobre a minha casa. Ele era muito bonito, parecia uma bola de pelos, mas fedia demais, então minha mãe mandou que eu o devolvesse à dona.

    Quando fui devolver o animal, lembrei-me que na beira do rio Paraitinga uma capivara havia dado à luz, então fui para lá. Para minha surpresa, vários bebês estavam dormindo. Sem pensar, agarrei um deles e fui correndo pela mata. De repente, ouvi um barulho. Olhei para trás, lá vinham os pais furiosos comigo. O medo foi tão grande que joguei o filhote no chão e subi numa árvore. Eles foram embora e eu fiquei mais calma. Na correria nem sequer percebi que tinha rasgado o vestido de cima a baixo. Se voltasse para casa naquele estado, com certeza ia levar uma bronca ou até mesmo uma surra, porque minha mãe tinha pedido que eu não colocasse aquela roupa, pois era a única que eu possuía para passear. Então, tive uma grande ideia. Procurei um enorme galho de lenha e fui arrastando pelo caminho. Eu diria à minha mãe que havia rasgado o vestido ao carregar a lenha.

    Ao chegar em casa comecei a gritar: "mãe, mãe". Ela respondeu: "o quê?!". "Trouxe a lenha", disse segurando o vestido rasgado. De repente, ela saiu com uma vara na mão e eu me assustei. Pensei que o plano não havia dado certo, virei para sair correndo. Então, dei de cara com um amigo da família que gostava de brincar comigo. Ele me segurou pelas costas do vestido. O medo era tão grande que levantei os braços e fugi para a mata deixando o vestido nas mãos do rapaz.     

     No meio da mata, passei o dia sem comida e sem água, escondida. Enquanto isso, todos já sabiam da história: tios, primos e avós. Ninguém se importou, pois eu era da pá virada. Era quase meia noite quando ouviram minha mãe chamar por mim, então ficaram preocupados. Quando eu não estava em casa estava na casa de um deles. Começaram a procurar.

    Procura para cá, procura para lá, o amigo que tinha o apelido de Gambá se lembrou que eu tinha ido em direção à mata. E lembrou também do filhote de urubu. Ele foi atrás e me encontrou pelada e abraçada com o bicho. Eu não queria ir para casa, estava com muito medo. Ele me agradou e me convenceu a voltar.

    Chegando em casa, minha mãe me perguntou por que eu saí correndo. Respondi a ela que estava com medo de apanhar por ter rasgado a roupa e que a vira com a vara na mão. Rindo, ela disse que a vara era para o gato que estava atormentado na cozinha. Olhando para ela com cara de cachorro que caiu do caminhão de mudanças. comecei a entender que mentir não daria certo, que talvez falar a verdade seria melhor.

(Autora: M.J.A)

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