quinta-feira, 3 de dezembro de 2020

FARRA DE CAUSOS (XIII)

 

Muriqui do Jarbas (Arquivo JRS)

    

MACACO SAFADO

    Quando eu era mocinha, morávamos no bairro do Sumidouro. Meu pai e meus irmãos eram caçadores. Um dia, de tardezinha, ouvimos uns assovios. Aí meu pai falou: "tem macaco aí". Meu irmão pegou a espingarda e deu um tiro certeiro. O tiro atingiu uma fêmea que carregava seu filhote nas costas. Ela pegou seu bebê e mostrou para ele. Ficamos tristes, mas era preciso cuidar dele.

   Dei a ele o nome de Tedi e, com uma velha chuquinha, criei-o. Ele cresceu e ficou muito safado: roubava pão, a mamadeiras das crianças e fazia a maior bagunça na panela de arroz. Não podia ver uma mulher que fazia gestos de safadeza e se coçava. Minha mãe não gostava, ele tinha vergonha porque éramos muito meninas. Um dia ele me disse: "é melhor vendê-lo". Tendo crescido em casa, ele não sobreviveria na mata. E assim foi feito.

(Autora: I.V.L.S)


Para reflexão:

    Houve um tempo em que muitos caiçaras caçavam. Uns diziam que era para variar a dieta, outros porque havia necessidade mesmo. No fundo, apesar das necessidades, digo que era o instinto de perseguir, de matar que existe em nós humanos. Hoje tem gente entrando no mato para caçar com finalidades criminosas. A maioria não é caiçara. Uma pessoa me contou no ano passado: "Aqui em Ubatuba tem gente de posses que encomenda determinado tipo de caça e paga muito dinheiro por ela. A paca é das mais caras, mas o quati, na crença que aumenta no homem a potência sexual, também passa maus bocados. O caçador, com o animal abatido, faz um telefonema e a pessoa vai na casa dele com seu carrão pagar e levar a mercadoria". 

    No Brasil atual, onde o discurso de ódio é muito forte a partir do mandatário-mor (eleito pela maioria da população), o que assistimos é o descaso pelas vidas, inclusive dos animais. O policiamento ambiental existe, mas parece não enxergar um monte de absurdos gritantes ao nosso redor, na Mata Atlântica. Segundo os noticiários, além do notório desmonte da vigilância ambiental no país, no ano passado nenhuma multa ambiental foi paga. Que precipício nos aguarda? Platão, um grego de tempos atrás, escreveu: "A impunidade deixa os maus ainda piores".

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