sexta-feira, 23 de março de 2012

TODO DE BRANCO

Vitória e mamãe continuam com suas gargalhadas em nossas lembranças.
                  A saudosa comadre Vitória era fantástica nos causos,  principalmente naqueles que causavam arrepios na criançada.Mesmo convivendo muito tempo no meio da caiçara, a sua preferência era pelas suas memórias de criança, quando ainda estava na roça, em Minas Gerais.



Vitória conta como surgiu um medo que a perseguiu por muito tempo: “Eu tinha uns nove anos e morava numa fazenda em Piuí, Minas Gerais. Eu, a Rosa e a Otília, minhas irmãs, dormíamos num catre antigo que ficava na sala.

Numa madrugada acordei sonolenta e vi um homem todo vestido de branco e com chapéu de palha também branco que chegava ali. Ele deu um gemido para subir um degrau na entrada do cômodo e chegou no pé da cama onde pôs a mão num paninho que nós deixávamos ali estendido – era um paninho amarrado com fio de nylon com o qual costumávamos brincar – segurou o paninho nas mãos e ficou ali jogando de um lado para o outro, como que examinando seu feitio. Pensei “devo estar sonhando”, mas não estava, abri bem o olho para ver se era real e o homem foi levantando a cabeça bem devagar deixando ver seu rosto de pele muito branca e pálida, e seus olhos calmos e profundos me olharam demoradamente, me enchendo de pavor. Meu pai começou a tossir no quarto. Fui me encolhendo, não queria nem me mexer de tanto medo, mas puxei a coberta sobre a cabeça e quando descobri, ele tinha chegado mais perto e me olhava intensamente. Quando meu pai voltou a tossir tomei coragem de gritar “pai tem um homem aqui”. Vi meu pai chegar assustado seguido por minha mãe e ao olhar de novo o homem tinha sumido!

“Foi pesadelo, não tem ninguém aqui”, me disseram. Descrevi para minha mãe o tipo que eu tinha visto e ela disse “parece meu irmão”. Meu tio, que eu não cheguei a conhecer, havia morrido há pouco tempo, em Passos. Ela foi buscar o retrato guardado e me mostrou: “é esse mesmo o moço que eu vi”. Para mim não havia dúvida. Rezamos todos pela alma de meu tio, mas eu fiquei com um medo terrível dos mortos desde então.

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