quarta-feira, 20 de janeiro de 2021

ALFAIATE POUCO TALENTOSO

Leovigildo e Laurentina (Arquivo nosso)


Com a filha de João,

Antônio ia se casar,

Mas Pedro fugiu com a noiva,

Na hora de ir para o altar.


    Assim é parte da antiga música das festas juninas. Quem não sabe que não é de hoje que sempre tem alguém fugindo de casamento?  Outro Antônio fez o mesmo, quando eu entrava na juventude: não quis saber de presenciar o casamento da filha. Ficou com curiosidade? Quer saber mais? Conto agora, ué!


   Antônio, bom católico, do tipo que animava celebrações na capela da praia, seguiu fielmente a recomendação bíblica, conforme está escrito: "crescei e multiplicai-vos". Assim que se casou veio uma linda menina abrindo a carreira de muitas outras crianças que viriam na força do  peixe com banana verde e farinha.

   A menina cresceu e logo se engraçou pelo primo em segundo grau, que era vizinho mais próximo, morador na beira do rio, depois do bananal. Se encontravam às escondidas pelos caminhos e no jundu. O amor é lindo! Só que nem o pai e menos ainda a mãe, seguindo a moral deles, aprovavam o namoro entre eles. "Mas quem vence um amor praiano?", diria Idalina Graça  O amor e a teimosia da juventude venceram; o casamento foi inevitável.

   No dia do casamento, quase no final da década de 1970, Antônio tomou uma decisão radical: embarcou o restante da família no carro (uma brasília que já nem me lembro de que cor era) e sumiu para não participar e nem ficar perto do evento. Os irmãos dele fizeram duras críticas no dia: "Onde já se viu isso! Que cristão é ele?", "Que papelão! A filha não merecia isso!", "Ele não podia fazer uma coisa dessa!" etc.

   A festa foi linda. Os pais do noivo, gente pobre como todo mundo dali, fizeram de tudo para deixar o espaço do terreiro muito acolhedor; não cabiam em si de contentamento. Toda a parentalha do lugar, só caiçaras naquele tempo, estava presente. Enquanto houve comida, bebida e os tocadores aguentaram, a festa durou. Era só alegria.

   Depois de tantos anos, recordando os rumos daquela gente toda, digo que aquela foi a única oportunidade de Antônio ver uma filha casada  conforme a tradição, pois as demais não lhe deram tal prazer. Os restantes, da imensa  da prole, foram se apaixonando, se ajuntando, se separando, se tornaram pais e mães sem se casar. Que coisa, né? "Destino é alfaiate pouco talentoso", dizia  a nossa tia Iaiá.

   Para onde foi Antônio e a esposa levando a filharada naquele fatídico dia? Se deslocaram para o lado norte, passaram o dia com o compadre Tié, acabei sabendo depois. Que proeza para fugir do casamento da filha!

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