terça-feira, 26 de janeiro de 2021

SANGUE BOM

 

Grande Júlio! (Arquivo MST)


Eu, Nelson e Júlio com sua inseparável bolsa (Arquivo JRS)

     Partiu Júlio César Mello, o meu mais que amigo Júlio, de Juiz de Fora. Era diabético. Mais uma vítima do vírus desdenhado pelo excrementíssimo genocida e mitômano que, depois de eleito democraticamente, está empenhado em acabar com a democracia. É triste, mas a gente já previa isso. Conforme as palavras do Júlio, na prosa do ano passado, por ocasião da nossa visita a ele e sua família, "muita gente tem as mãos manchadas de sangue nesses crimes e nessas mortes que decorrem do presidente do nosso país. Como pode o ódio valer mais que o amor, Zé?".

     Júlio, desde que eu o conheci, em 1985, teve uma trajetória de vida ao lado dos mais pobres, dos excluídos, militando nos movimentos sociais. Sua sensibilidade e fidelidade fez com que logo se engajasse nas lutas pela terra. Em Cachoeira de Macacu, no Rio de Janeiro, militou no campo, entre os trabalhadores rurais, se apoiando nas orientações da igreja católica através da CPT (Comissão Pastoral da Terra). Em seguida, na cidade de Santo André e adjacências, em São Paulo, a sua presença nos movimentos de favelas e nas CEBs (Comunidades Eclesiais de Base) firmou mais ainda o seu caráter de entrega através da solidariedade, da organização, da esperança e da alegria de conviver com os mais necessitados. Depois de passar um tempo no Nordeste com a companheira Francisquinha, retornou ao seu chão de origem e se ligou ao MST (Movimento dos Sem-Terra). E assim me reencontrei com ele há cinco anos: estava totalmente entrosado e participando desta organização-resistência dos trabalhadores rurais que há 37 anos despontou como luz para o povo que vive oprimido, sujeito ao poder assassino dos latifundiários e das leis ditadas pelo poder do dinheiro. Hoje, o MST é uma esperança real não só para o Brasil, mas também para o mundo. Para quem não sabe: a organização e o trabalho dos trabalhadores rurais continua distribuindo toneladas e toneladas de alimentos aos desesperados, aos que são marginalizados e perseguidos na própria pátria, sobretudo neste tempo cruel.

    Mulheres, homens e crianças sentirão falta do Júlio, das suas ações e apoios. Em uma das minhas idas a Juiz de Fora fui me encontrar com ele no espaço externo de uma igreja, onde acontecia uma feira dos produtos oriundos da área de ocupação (assentamento Dênis Gonçalves) onde se fazia mais presente, dava cursos e celebrava os bons momentos. Era o meu amigo que articulava com o pessoal do MST essas feiras pelos diversos pontos da cidade e no campus da universidade (UFJF - Universidade Federal de Juiz de Fora). A minha família sempre foi encantada pela dona Lourdinha, sua mãe, e, pelo ser acolhedor que era o Júlio. Quem de nós, que conhecemos e convivemos com tão grande exemplo, não há de se lembrar dele para sempre? Marcelinho, um menino da favela São João Batista, um dia me disse isto: "O seu irmão Júlio é sangue bom, sabia?".

   Abraços e nossos sinceros sentimentos aos familiares do estimado Júlio. Muita força mesmo!

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