terça-feira, 7 de agosto de 2012

PUXADA DE REDE



Por vários anos, desde 1990, os alunos da Escola "Aurelina", no bairro da Estufa II, apresentaram a Puxada de Rede. Hoje, a pedido do meu amigo Nerci, publico a introdução daquele espetáculo que marcou a história de muita gente.


Introdução:

Leitor 1:     Os atos humanos são possíveis de transformações, de receberem acréscimos para que fiquem mais agradáveis, com mais  movimentos etc. Enfim, tudo pode, com uma pitada de criatividade, ficar mais gostoso. Assim foi o que aconteceu com a vida de dureza, que é o trabalho do pescador, principalmente daquele que pesca artesanalmente.

Leitor 2:     Primeiramente é preciso imaginar os negros como escravos por mais de trezentos anos na história do Brasil. Depois, para quebrar a monotonia da pesca de rede puxada na praia, eles emprestaram aos movimentos dos homens do mar a graça do ritmo e da coreografia ao som de seus instrumentos, fazendo do cansaço na maresia uma alegria sem igual.

Leitor 3:    É uma forma de resistência. Provavelmente eles já traziam da Mãe-África essa singular arte. Afinal, muitos dos escravizados provinham do litoral do imenso continente negro. Aqui só receberam os ingredientes dos índios e dos portugueses pobres.

Leitor 1:      No Estado da Bahia, região em que  a fidelidade às raízes sempre foi muito forte, os negros cultivam com muito entusiasmo a Puxada de Rede. Por volta de 1978, através do trabalho desenvolvido pelo mestre de capoeira JEQUIÉ, esta arte foi trazida para Ubatuba, onde o pescado sempre foi uma base importante na cultura caiçara.

Leitor 2:      Nós, membros da escola local, há anos nos dedicamos nos ensaios e apresentações para que a iniciativa do mestre JEQUIÉ nunca esmoreça. É preciso que o povo tenha sempre viva-memória daquilo que brotou da criatividade da alma e da resistência à morte.

Leitor 3:      A pesca do xaréu, da tainha e de outros tantos é um espetáculo de poesia, de canto e de ritmo ligado ao mar, às ondas em sua inigualável força.

Leitor 1:    Para uma redada na praia são necessários muitos braços, muitos homens fazendo força no lagamar, os atadores, um mestre do mar, um mestre de terra e um mestre geral.

Leitor 2:      A rede é  tecida durante os meses em que o peixe deixa de passar. São necessários muitos metros de cordas, quilos e quilos de fios, um  mundão de cortiças e chumbeiros. Por fim, haja paciência!

Leitor 3:    É um trabalho sem fim, de fio a fio, pago por braças que vão se fazendo nos nós. As malhas grandes e os cabos de corda recebem banho de casca de aroeira ou de cajueiro, boias de cortiça, pesos suficiente na parte de fundo. Depois tudo isto vai ao mar.

Leitor 1:    É uma embarcação  enorme que carrega essa rede; tripulada por gente que conhece quase todos os segredos do mar. Ela atravessa a arrebentação como uma imensa tartaruga, desovando uma longa fileira de boias num grande semicírculo que cercará os peixes.

Leitor 2:    Não há viva alma nos ranchos do jundu. Todo mundo está na praia. Em pequenas embarcações os homens do mar sondam, calculam a quantidade de peixes no cercado.

Leitor 3:     O mestre do mar, agitando o chapéu e por assobios, transmite tudo ao mestre de terra. Do mestre geral vem a ordem de iniciar a puxada da rede. A areia é alva; os pescadores são escuros de nascença ou curtidos pelo sol abrasador. Da luz intensa da manhã sobe um cântico empolgante.

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