terça-feira, 24 de agosto de 2021

PAPAI E A BICICLETA RALEIGHT

A bicicleta Raleight  - Arquivo internet

Papai e o mano Mingo - Arquivo Documentário


      Papai e mamãe casaram-se com casa pronta na medida do possível e da pobreza deles daquele tempo, final da década de 1950. Era uma edificação de tijolos e telhas cerâmicas  - tipo francesas, da marca “Paulo Becker”  -, com piso de cimento. Tudo feito por papai e alguns irmãos e amigos, pois ele era craque em construção civil, se dava bem como pedreiro e carpinteiro. Aliás, “Carpinteiro” era o seu apelido. Foi o nosso primeiro lar, na praia do Sapê. Eu e mais três crianças nascemos ali. Minha avó Martinha, a parteira, teve trabalho. No começo de 1969, fomos de mudança para a praia da Fortaleza. Quem comprou a nossa propriedade no Sapê foi o tio Antônio do Prado, da tia Santa, sendo as promissórias quitadas por intermédio do tio Ângelo, casado com a tia Belinha.

     Algumas tecnologias, modernidades daquele tempo, marcaram essa minha primeira infância. Um exemplo era um caminhãozinho barulhento, cujo dono bem poderia ser o Biduca. A partida desse veículo tinha de ser dada por uma manivela engatada rente ao para-choque dianteiro. Outro fato marcante foi a construção da rede elétrica, quando a empresa fincava postes e esticava cabos de arame pelas picadas, sobre as matas, com seus maquinários no areão da tia Rita Carlota. E  aquela bicicleta estrangeira, uma Raleight do papai!? Que máximo!

    Sim, que máximo! Pesadona, com assento de couro cru sobre molas amortecedoras, bolsa de ferramentas sob o cano horizontal que ligava o garfo à base da seleta. E aquele farol alimentado pelo dínamo, que gerava energia no contato com o pneu em movimento!? Tinha ainda: para-lamas nas rodas, fitinhas coloridas nos terminais do guidão, espelho retrovisor e uma flâmula de time de futebol, do Palmeiras, orgulhosamente ostentado pelo proprietário.

    Eu e os demais filhos, uma miuçalha só, nunca imaginaríamos de um dia sair pedalando. Aquilo era coisa de gente grande, de quem precisava ir trabalhar mais longe. Alegria nossa, era, nas folgas do pai, ser levado a dar uma voltinha até a pista, ver mais movimento de gente na Praça Santa Cruz, mais conhecida hoje como Largo do Sapê.

     A Raleight era preta e portentosa aos nossos olhos. Só não me recordo que fim levou tamanha preciosidade. Sim, era estrangeira, veio da  Inglaterra! Isto eu soube bem depois, mas nunca esqueci devido a uma expressão recorrente do vovô Estevan: “Porcaria até, porcaria até. Ai que dor na grãbretanha”. Você é capaz de imaginar onde era a Grã Bretanha do vovô?


2 comentários:

  1. Mais uma leitura incrível... Amo esse lugar que você tão poeticamente relata...aliás fiel descrição... Muito obrigada pela oportunidade 😊

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  2. Gratidão, amiga! Muita paz e saúde para você e os seus!

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