terça-feira, 2 de outubro de 2012

O TALENTO DA FÁTIMA


Aroeira madura na espera de passarinhos.

                A amiga Fátima sempre foi muito preocupada em registrar os aspectos da cultura caiçara, da nossa história. O seu livro Arrelá Ubatuba é só isso.  Hoje, querendo entender sobre o lugar dos seus, parte do seu lado materno (região da Praia Dura e Folha Seca),  ela recolheu a seguinte preciosidade:

                “O Rio Cajarana, que nasce no Corcovado, em determinado ponto do trajeto se divide em dois, formando outro braço que é conhecido como Rio do Meio. Esses dois rios vêm se encontrar novamente no Rio Escuro, formando um bolsão de mangue, propício ao desenvolvimento de várias espécies de madeira, inclusive a caxeta.

                “Noutros tempos, quando ainda era caminho, nesse bolsão formava um areião recoberto por uma camada de folhas secas que, ao serem pisadas, faziam muito barulho. Daí tira-se a conclusão, segundo os antigos, do nome dado a esse lugar [Sertão da Folha Seca]”.

                Agora, confirmando o que o meu pai relatou sobre o empreendedorismo de Magalhães, a Fátima escreveu:

                “No final dos anos quarenta, um senhor chamado Magalhães veio do Rio de Janeiro e montou uma serraria na Praia Dura. Extraía caxeta do Sertão da Folha Seca e mandava em toras brutas para o Rio de Janeiro. Depois de algum tempo, absorvendo a mão de obra local e alguns que vieram do Rio de Janeiro, foi criada uma fábrica de beneficiamento de madeira. Ali a caxeta era transformada em tábuas e toletes de tamanho padrão, que eram embarcadas em navios, para depois serem transformados em lápis, tamancos e outros derivados.

                Contam os antigos que a madeira era cortada, amarradas umas às outras como se fossem uma balsa, sendo transportadas boiando rio abaixo. Quantidades enormes vinham para a serraria todos os dias.

                Tempos depois, com a escassez de madeira, e alguns problemas pessoais, a serraria fechou.

                A realidade de hoje dói. Quando se passa pelo local, se depara com o estado de total abandono. Nos dois rios nem peixes existem mais. O agrotóxico das plantações passadas e o esgoto deixaram os rios de águas claras e piscosas em estado de calamidade. Pode-se dizer um rio fétido, lodoso, morto e esquecido, que se vinga quando inunda tudo em época de enchente, matando tudo que é plantado.

                Em sua vingança o rio está matando também os pés de cambucás, bacuparis, jabuticabas e laranjeiras plantadas ali pelo meu avô [Salvador Carlos], um dos novos donatários que fez dali seu reinado”.

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