segunda-feira, 15 de fevereiro de 2021

MINHA FILHA ARTEIRA

Cerâmicas da Maria Eugênia (Arquivo JRS)


       "Dito do barro" era o apelido dele. Nasceu, sempre viveu e morreu na Ilha dos Búzios, no lugar chamado de Guanxumas. Ainda tenho guardado um pito dele. Alguém levava suas miudezas para oferecer aos turistas na Ilhabela,  gerando uma renda a sua arte, o seu trabalho com barro herdado dos pais. Um dia ele me explicou o passo a passo.

       "É assim: primeiro tem de saber reconhecer um barro de liga, que dê para ser modelado. Depois, caso não queira se sujar à toa, assim que der uma chuva, vai-se à procura de lugar onde esse barro ficou empoçado. Deixa secar ali mesmo, onde estiver. Só recolhe o lodo do fundo depois de seco. Fica parecendo pedaços de chocolate, vai se rachando com o calor do sol. É o que eu uso para fazer tudo isso que você tá vendo. Eu levo para o terreiro, quebro tudo em farelo. Depois uso uma peneira bem fina para não deixar nenhuma pedrinha. Guardo tudo bem protegido e vou usando com o tempo. Molho a quantidade que penso em usar no dia. Nas peças moldadas passo cinza do fogão e deixo secando. Por fim, segue para o fogo. Ali mesmo, no fogão de casa. Só quando tem uma vasilha maior é que armo uma fogueira na furna do barranco".

       Eu entendi. Processo simples, herdado dos antigos. Será que veio dos índios? Também pode ser técnica dos africanos escravizados ou dos pobres portugueses trazidos para as terras do nosso litoral. Só precisei de um esclarecimento:

    - Por que precisa passar cinza, seo Dito?

    - Para não rachar, rapaz. A cinza evita que a peça se quebre no fogo. 

    Ah! Que bom ter conhecido e convivido com tanta gente boa e cheia de sabedoria! Já a minha filha aprendeu outras técnicas, na universidade. Usa argilas diversas, compradas. Adoro as peças em que ela se dedica com tanto esmero! Menina talentosa que teria dado muita atenção ao artista caiçara, caso estivesse junto comigo naquele tempo.








 

Nenhum comentário:

Postar um comentário