sexta-feira, 19 de julho de 2019

ARRELÁ! QUE PADECÊ DESSA GENTE!


Indaiás a serem semeados (Arquivo JRS)

Arte nas férias (Arquivo JRS)

               “Ah! Sempre lutando, lutando, padecendo...”. É uma expressão que não sai de moda entre os mais pobres, desde os antigos caiçaras. Hoje, mais acentuadamente, por escolhas infelizes, vemos aumentar esse sofrer, esse penar da nossa gente. Uma música nem tão antiga dizia assim no refrão: “Bem feito! Quem mandou votar no homem!?!”. Mediante a crise planejada para beneficiar, de verdade, apenas uma mínima fração da população, talvez tenhamos de retornar pouco a pouco aos antigos recursos (fazer abrigo de pau a pique, recolher sapê ou guaricanga para cobertura, redescobrir os alimentos que estão na mata, as taiobas que vicejam nas beiras dos caminhos, pescar, recolher os seres pelas costeiras na maré baixa, reaprender o tempo da brejaúba, do indaiá, dos maracujás etc. ).

             “Pra mode de quê?”. Ora, a vida é uma luta! Lembrei-me de uma situação vivida há bastante tempo, quando nem cerca havia entre as posses: 

            “Vim de  caçá depois da badeja, onde um bicho tem carrêro. Esperei, esperei, esperei... Nada de arguma coisa aparecê. Então, pra mode não vortar sem nada, calhô de reconhecê umas tralhas de cará. Tá aí, ó: a gente pode padecê, mas de fome não morre”.

               As imagens retornam, as falas se repetem na memória. Sempre tinha canoa embicando na praia ou vencendo a arrebentação para garantir o pescado. Nos jundus, nos jiraus de bambu, ficavam as panagens estendidas. As redes eram importantes instrumentos de trabalho. Ordens assim se repetiam conforme se observavam as ondas: 

             “Bota a panage na canoa e rema pra fora ligêro. Depois levanta o pano que o vento tá do jeito. O peixe tá grosso, o cardume se acomodô pra fora da laje do Saquaritá".

               Hoje sabemos que tudo na natureza tem seus limites, tornam-se escassos pelas devastações e demandas. Por isso, desde muito tempo, nas minhas andanças, levo sementes para outros espaços. Pode ser que alguém já tenha me visto, por exemplo, subindo a serra e lançando alguma coisa, em espaços de tempo, pela janela do carro. Estou semeando. Certamente que algum ser vivo já está comendo araçás, abacates, goiabas, coco jarobá e outros das sementes que deixei pelos caminhos um dia. Aprendi com os mais velhos esse costume: 

         “Pega o pau de rama, assim, bota na cava, enterra que ele nasce”, “Não é um pé de pau qualqué. Quando crescê vai sê só periquito nela: é painêra. Não estrague não”, “Acuda a sua vó no fogão. Ela tá fazendo pixé com aquele milho de treisantonte, que truxemo da roça do João Firmino”, etc.

                É, a coisa tá feia! Ou atuamos a favor de uma política a favor da maioria ou vamos mesmo por esse caminho, procurando migalhas, condenando as futuras gerações desde já.

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