sábado, 20 de setembro de 2025

MESTRE CHICÃO


Mestre Chicão  - Arquivo JRS 


     Ipiranguinha, bairro de Ubatuba que me acolhe há trinta anos, tem uma grande e diversa população. Dia e noite você encontra gente se movimentando em suas ruas, com destaque para uma classe trabalhadora sempre contribuindo muito com a vida econômica do município. Carros e bicicletas circulando comprovam o corre-corre da nossa gente. Além de tudo, esse nosso lugar tem uma intensa vida social, com movimentos e organizações de todas as matrizes. Dentre as lideranças locais, eu ouso destacar a do Mestre Chicão.

   Chicão, na sua humildade, em todos esses anos da minha convivência com a realidade local, escolheu a capoeira para dar a sua contribuição social. Quantas pessoas, motivadas por ele, passaram nesse esporte em todos esses anos? Centenas! Em seu humilde espaço, próximo da igreja católica do bairro, onde conheci a Madre Sofia, no início da década de 1980, tocando projetos de educação e de profissionalização, esse capoeirista veterano, cria do Mestre Preguiça, encarou o desafio de possibilitar treinamento a adultos, adolescentes e crianças. Seu lema, que eu escutava a cada oportunidade em que levava o meu filho para a roda de capoeira, era: "Esporte é vida". E, antes de iniciar os exercícios de aquecimento, Chicão fazia uma breve explanação do que o lema da academia perseguia e desejava a todos que o procuravam para aprender a arte da capoeira, esse esporte-jogo cultivado pelos ancestrais trazidos escravizados, no passado, da Mãe-África. Muito me orgulho dessa capoeira brasileira, dessa arte que hoje se espalhou pelo mundo inteiro!

      O nosso referido mestre capoeirista, em grande parte de seu tempo segue na lida de carpinteiro, se virando na sua profissão. Nasceu pobre e continua na labuta para sobreviver e manter seu projeto de vida (ensinar capoeira no bairro). Quem da vizinhança nunca ouviu as batidas e os cantos da Academia Liberdade Camará? Quem nunca presenciou encontros de capoeiristas promovidas em escolas do bairro? No entanto, dias desses eu encontrei o estimado mestre em situação precária, de muletas, quase não podendo andar pelas ruas do nosso bairro. Depois de perguntar do meu filho Estevan, seu aluno no passado, tristemente me contou: "Já faz tempo que surgiu um problema nas pernas. Incharam, surgiram umas bolhas. Dói demais. Eu tenho ido ao posto de saúde, fui examinado, mas ainda não descobriram o que é, nem conseguiram me curar. Eu tô levando as coisas assim, mas tá difícil. Nem tô podendo trabalhar. Tá difícil, viu!? Será que eu consigo receber uma cesta básica para aliviar um pouco?". Para piorar ainda mais, surgiu um problema na mão desse profissional, carpinteiro como o meu saudoso pai: um dedo atrofiou e segue sempre dolorido. Resumindo: a fase pela qual passa agora o estimado mestre de capoeira do bairro fez me lembrar uma frase da finada mãe do estimado Carlos Laureano: "Quando urubu tá com azar, o de baixo caga no de cima". É triste a situação do Mestre. O que a comunidade pode fazer em solidariedade e reconhecimento pelo significativo empenho desse Mestre à vida social do bairro?


 

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