sexta-feira, 18 de fevereiro de 2022

SIGAMOS OS BONS ESPÍRITOS

No lagamar, em Itaguá - Arquivo JRS

 

Bruce Albert, no livro (A queda do céu) em parceria com Davi Kopenawa, registra nas páginas 524/525:


   Voltei em setembro de 1978 para Brasília, onde me hospedou uma amiga, intrépida e rebelde jornalista do Jornal de Brasília (e depois da Folha de São Paulo), Memélia Moreira. Lá me encontrei um belo dia com Cláudia Andujar, extraordinária fotógrafa, apaixonada pelos povos indígenas, que tinha começado a trabalhar na região do rio Catrimani em 1974. Redigimos juntos o primeiro documento contrário ao projeto militar de desmembramento das terras yanomami. A convite dela, fui encontrá-la em São Paulo, onde, junto com Carlo Zacquini, irmão católico e missionário fora do comum da missão Catrimani, elaboramos o projeto de uma vasta reserva territorial yanomami contínua, antes de lançarmos, no Brasil e no exterior, uma campanha de opinião pública contra a iniciativa etnocida da ditadura militar.

   Naquele final de 1978, ocorria em São Paulo uma impressionante mobilização política e midiática contra o projeto, levado a cabo pelo governo Geisel, de espoliação das terras indígenas, projeto esse disfarçado de decreto de “emancipação” dos índios “aculturados”. Esse movimento de protesto sem precedentes marcou a conjunção entre o movimento indígena nascente e setores intelectuais (advogados, jornalistas, acadêmicos) engajados na resistência à ditadura militar, então em sua fase de declínio. Foi nesse contexto político que Cláudia Andujar, Carlo Zacquini e eu criamos a Comissão Pró-Yanomami (CCPY), com o apoio incansável de Beto Ricardo e vários amigos paulistanos, uma ONG que lutaria durante  quase três décadas para defender os direitos do Yanomami, até que estes fundassem sua própria associação, a Hutukara Associação Yanomami, presidida desde a sua criação, em 2004, por Davi Kopenawa.


   Estes três estrangeiros: Bruce Albert  (França), Claudia Andujar (Suíça) e Carlo Zacquini (Itália), cujas demonstrações de amor pela vida dos povos da floresta me calou fundo, devem nos despertar para um detalhe: eles fazem parte de uma minoria que veio para a nossa Pátria e fez tantas coisas pelos povos originários, pelo povo Yanomami e pela causa da natureza. Agora pergunto: Quantos brasileiros sequer ouviram falar desse povo? Quantos dos nossos apoiam a causa indígena? Por ocasião da minha passagem por Inhotim, o famoso museu de Brumadinho, admirei as imagens dos indígenas que atestam a paixão de Claudia Andujar. Um pavilhão inteiro dela!  Detalhe: ela foi a fotógrafa da menina Nini, no antigo Hotel Picaré, em Ubatuba. Ver texto....https://coisasdecaicara.blogspot.com/2016/10/a-menina-nini.html 


    Enfim, para continuar pensando como caiçara: 

  Não queremos que nossa mata, rios e mar desapareçam, nem que sejam exterminados os povos das florestas e as demais populações tradicionais que são faróis das  nossas raízes existenciais. Portanto, revelemos aos nossos filhos os dizeres, os saberes de nossos ancestrais. Os caminhos das novas gerações devem ser ilustrados por aqueles valores que estão dentro de nós, na profundidade de nosso ser. Não deixemos que eles desapareçam, mas sim que se renovem com o passar do tempo. Sigamos os bons espíritos!

Nenhum comentário:

Postar um comentário