sexta-feira, 31 de outubro de 2014

O NAMORO DO NANICO

Velhos caiçaras (Arquivo Trindadeiros)

         Não é de hoje que as pessoas aprontam das suas! Tudo pode acontecer quando se vive em sociedade, por mais reduzida que seja a povoação. Um exemplo que narro agora ocorreu na Praia Grande do Bonete, uma das maravilhosas comunidades do município de Ubatuba. A época era essa, próxima de Dia de Finados, no final da década de 1950. O personagem principal era o finado João Nanico. O tema foi adultério. Os intrometidos, que após sondagens flagraram o afoito roceiro-pescado: tio Tião e Chichico.

         Numa comunidade pequena, pouca coisa escapa das percepções dos moradores. Às vezes, nem precisa falar nada para despertar suspeitas. Assim foi com os dois: se olhavam de vez em quando como se estivessem combinando alguma coisa, saiam pelos caminhos que se encontravam em algum lugar, riam de frases maliciosas, trocavam presentes etc. O primeiro a sondar as saídas do João Nanico para a casa de sua comadre foi o meu tio, reconhecidamente um arteiro até os dias atuais. Ele se esgueirou entre os abricoeiros do jundu, na escuridão das grandes árvores, para confirmar a suspeita de que quase todas as noites os amantes se encontravam na casa dela e se amavam perdidamente.

         “Ela espera o marido inválido dormir, dá um sinal pela janela da cozinha... e lá se vai o Nanico para a camarinha que está do outro lado da casa, perto da cozinha. Ele entra pela janela”. Depois de escutar a novidade trazida pelo tio Tião, o Chichico combinou uma parceria para a noite seguinte. No outro dia, no horário previsto, ao sair de sua casa, distante mais ou menos trezentos metros da casa da amante, o velho caiçara foi seguido pelos dois dispostos a darem um susto no casal. Logo que o nosso personagem principal estacou no terreiro, os dois se ocultaram atrás da grande jaqueira que ficava quase na porta da cozinha. Não demorou para aparecer a claridade da lamparina sinalizando que o momento era aquele. E lá se foi o Nanico.

         De forma bem sorrateira, muito cauteloso para não fazer barulho algum, estando em boa forma física, o Nanico foi passando confiante e ansioso pela janela aberta. É o amor, né?!? Nesse instante, saindo de trás da jaqueira, os dois correram e deram um empurrão no aventureiro. Foi uma barulheira só porque deve ter caído sobre panelas do outro lado. No mesmo instante os dois arteiros sumiram em direção à praia. Bem longe foram dar risadas e imaginar a situação constrangedora aos amantes. Afinal, alguém os pegara no pulo.

         No dia seguinte, o João Nanico estava machucado. Ao ser questionado, a resposta era: “Tropecei na noite passada numa porcaria de balaio que estava no corredor da casa e bati de cabeça num armário de louça”. Coitado do Nanico! Só muitos anos depois, quando não faltava muito tempo para morrer, é que soube da verdade. Quem contou a ele foi o próprio tio Tião Armiro. Quantas artes fez este caiçara!
        


         

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