terça-feira, 24 de junho de 2014

PASQUIM (I)

Rancho no Puruba (Arquivo JRS)

       Quando eu era criança sempre aparecia uns escritos por nome de pasquim.
    Pasquim era uma forma de comunicação, geralmente em forma de verso, usada pelos caiçaras mais antigos.
     Na verdade eram como que bilhetes mandando uma mensagem direta ou indireta. Era assim: alguém escolhia um tema, escrevia e depois fixava em algum lugar para que as pessoas lessem.
     Geralmente os pasquins ficavam fixados numa árvore do jundu, perto de onde sempre tinha gente se reunindo para prosear. Mas também eram colocados em ranchos de canoas, para ficarem mais protegidos do tempo (chuva, sol, sereno...). O último pasquim caiçara eu encontrei nas cercanias da Capela Nossa Senhora das Dores, na praia do Itaguá, por volta de 1985.

Os temas variavam: podia ser a respeito de uma pessoa, de um romance, de um evento do lugar etc. Pesquisando mais, achei isto: 

     Os pasquins surgiram como cartazes pregados nas paredes da Itália, por vezes protestando politicamente, agradecendo a Deus por acontecimentos ou até pregando palavras de ordem pública, como respeito às autoridades. Com o passar do tempo, foram se tornando cada vez mais distribuídos pelas próprias pessoas para a população, adquirindo a característica de panfletos. Chegaram ao Brasil por volta do final do Primeiro Reinado, próximo à abdicação de Dom Pedro I, sendo muitas vezes repletos de calúnias, linguagem violenta, insultos, preconceitos e apelidos, e duraram um curto período, entrando em declínio no Segundo Reinado.   (Maria Carolina Palhano).

   Tendo em mente que a geração contemporânea talvez nem tenha ideia de que a existência virtual é uma característica recente na nossa sociedade, que tal rever alguns pasquins do povo caiçara ?

LOBISOMI
Credo em cruz, Ave- Maria! Coisa assim nunca que vi.
Nem que queira agora mesmo, já não posso evitá.
Assim como é inevitável que o rio corra para o mar.
Estava passarinhando ou ia já mariscá...
Nem me alembro mais direito o que mesmo tava fazendo.
Só me alembro do lugá, que era lá no jundu o ponto de se encontrá.
Era latido demais. 

Um bando de cachorro vadio latia aquele 

cachorrão.
Meu pensamento fugiu, se misturou com a chuva a zoá.
Agora alembrei do arrepio na cena a imaginá.
O cachorrão estacou quando o Joaquim 

com o seu remo uma bordoada deu.
Bastou uma só paulada para o bicho
desmaiá.
E logo bem de repente vi o bicho
transformá.


No final, quem lia o texto, já desconfiava que a história teria continuação. Ou seja, o próximo pasquim era aguardado.

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