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Além de comentar suas ideias inéditas a respeito de algumas transcrições, também levantou o tema de alguns problemas sociais do tempo de nossos pais, quando crianças e adolescentes eram levadas por alguns ricaços “piedosos” para “acabar de criá-los em melhores condições, dando roupas, escola, emprego...”. Ficamos pensando, então, como teria sido no tempo da escravidão oficial, quando os africanos e seus descendentes eram apenas objetos para qualquer uso do seu dono. Em Ubatuba, até o final do tráfico negreiro, em algumas praias eram desembarcados os coitados dos negros. O presente texto da Fátima mostra isso, surge desse contexto. 
        Parabéns, amiga!                                                                                                                                                                                               
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      Em alguns
  séculos atrás, as fazendas açucareiras de Ubatuba abastavam-se em divisas
  provindas da mão-de-obra escrava. Negros, arrancados de sua África como
  plantas arrancadas pelas raízes  jogadas em outros lugares a espera de
  serem replantadas ou descartadas do direito de viverem. 
      Não era
  difícil todas as noites se ouvir no terreirão da “Casa Grande” o pedido de
  misericórdia no ar, trazido através do som dos atabaques. Vinha de onde
  estavam os negros amontoados independente de sexo ou idade: a senzala. O machucado
  dos açoites, a falta de saneamento fazia proliferar doenças... Mas a maior
  dor, a dor mais insuportável era a falta de liberdade, a falta de
  reconhecimento de ser gente, a dignidade zero. 
    - Eh! Eh!
  Buana, nego nasceu pá apanhá! - Dizia Preto Velho, para camuflar e desculpar
  a dor. 
     Os lotes
  de negros comprados no Rio de Janeiro eram despejados pelos navios negreiros
  na praia de Ponta Aguda. Esses lotes aguardavam seus compradores no senzalão
  da praia da Lagoa. Para driblar a fiscalização à frente deste lugar erguia-se
  um cenário de “Casa de Fazenda” que nunca existiu. Quem olhava do mar tinha a
  certeza que se tratava de uma “Casa Grande” de fazenda, mas que nunca
  existiu. Era uma fachada para camuflar o senzalão. 
      Dito Carro
  apeou do cavalo, chicoteou o ar para impor respeito, pisou forte. O barulho
  de suas botas arrepiava de horror qualquer criatura que o conhecia. 
   Arrogante,
  o capataz bulia com os negros aos trancos, verificando a numeração das placas
  de cobre dependuradas nos pescoços judiados. 
    Um sorriso
  maligno lhe percorreu a cara quando achou o lote que procurava. Dois machos
  adultos, uma criança de aproximadamente dez anos e uma moça com o julgo de
  quinze anos, ornada por um colar de ossos trançados em palha de embira, além
  da numeração. Dandara
  era seu nome! 
      Dito Carro
  lambeu os beiços! Juntou uma mão na outra e estalou os dedos secos. Fez
  cantar o chicote com a força de um demônio. Arrastados aos trancos e
  barrancos os negros chegaram à fazenda destinatária. Dandara não tinha mais
  forças para aguentar tamanho suplício. Ferida e exausta se jogou num caco de
  esteira na senzala. 
      No céu a
  lua apareceu. Dentre as frestas da taipa a luz do luar fez brilhar o colar de
  Dandara. Aconteceu um milagre! As chagas de Dandara se fecharam. Neste
  instante a porta da senzala rangeu com violência. Dito Carro adentrou em
  busca de Dandara a fim de satisfazer seu vil prazer. O inacreditável
  aconteceu, o colar de Dandara inflamou-se e as chamas produzidas pelo colar
  queimou as mãos enormes e malévolas de Dito Carro, que se jogou no chão
  uivando de dor. 
    Dizem que
  pelo resto da vida esse meliante usou luvas para esconder as mãos sapecadas
  pelo fogo emanado do colar de Dandara. 
(Fonte: O Guaruçá) 
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sábado, 28 de junho de 2014
O COLAR DE DANDARA
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