terça-feira, 10 de setembro de 2013

VIAJAR DE CANOA


                
           Em tempo de folclore (saber popular), nunca é demais insistir numa coisa tão bem desenvolvida pelos caiçaras, sobretudo de Ubatuba: a arte de fazer canoas. 

           Andei por diferentes regiões, conheci muitas formas originais de locomoção, mas nenhuma delas me comove tanto como a canoa caiçara! Ela é bonita, de uma harmonia inigualável, bem característica do nosso litoral. Deixando a modéstia de lado, posso afirmar que a canoa do litoral norte paulista é a mais bonita de todas.
                Os caiçaras herdaram dos tupinambás a tradição da canoa. Foi Hans Staden quem primeiro observou, em 1555, sobre a arte de tirar da mata as perfeitas embarcações. Eis o relato do alemão:
                “Na terra deles há um determinado tipo de árvore a que dão o nome de igaibira. Eles descascam a casca dessa árvore de cima para baixo, num único pedaço. Para consegui-la inteira, fazem uma armação extra em torno da árvore. Transportam essa casca das montanhas até a beira do mar, onde ela é aquecida sobre o fogo e então dobrada para cima, tanto na parte de trás quanto na da frente. Antes disso, amarram madeiras no meio para que não se distenda. É dessa maneira que fabricam barcos, nos quais até trinta homens podem ir em expedições de guerra. A casca é da grossura de um polegar, tendo mais ou menos quatro pés de largura e quarenta pés de comprimento, algumas ainda mais longas, outras mais curtas. Com tais barcos, eles viajam o quanto quiserem, remando depressa. Se o mar está agitado,  arrastam os barcos para a terra até que o tempo melhore novamente. Não ousam afastar-se mais de duas milhas no mar, mas navegam trechos muito grandes ao longo da costa”.
                Foi a miscigenação, aliada à técnica e aos instrumentos trazidos pelos portugueses (machado, enxó, cepilho, formão goiva etc.), que permitiu um aperfeiçoamento das embarcações e possibilitou as aventuras marítimas dos pobres. Ela (canoa) sempre providenciou o sustento aos caiçaras. “É preciso ter uma canoa e uma casa de telha”, dizia a tia Maria Mesquita (do tio Genésio) referindo-se às condições, por volta de 1930, para um casamento com um mínimo de segurança.
                A necessidade é a mãe da criatividade. Este foi o princípio que despertou tantos fazedores de canoas, dentre eles o meu pai, nas tantas praias de Ubatuba. Muitos deles já morreram, mas suas fabulosas canoas continuam nos encantando, são testemunhas da perfeição estética que se alcançou em séculos de história.
                É isso aí!
                E viva a Mata Atlântica que sempre forneceu as grossas árvores para serem escavadas, transformadas em invejáveis canoas para serem manejadas por gerações de caiçaras!

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