sexta-feira, 6 de maio de 2011

Mané Hilário (Parte 15)


A revolta da ilha Anchieta 
         Ah, rapaz! O susto que nós levemo e a carreira que nós levemo! Nós tava trabalhando numa casa lá no Perequê-açu. Tava em cima da casa botando telha.
Hilário, o filho:
         Neste dia o senhor falou: “Você leva o armoço pra mim porque o serviço lá vai sê mais prolongado; vai demorar mais porque nós vamos fazê a coberta da casa. Então, alguém vai levar  o armoço pra mim”. E, justamente, eu que ia levando, encontrei uma pessoa. O senhor não trabalhou pro Zé Dito? Zé Dito da dona Suzana? Era da Pensão Imperial, aqui perto do Esteves da Silva. Eu ia levando almoço pra ele quando uma pessoa falô pra mim: “Olha, não vai não. Deixa o almoço do seu pai e volta com o almoço que houve uma rebelião lá. Os presos fizeram um levante lá na ilha e tá tudo espalhado por aí. E ele vai também ficar sabendo e já vai vim embora”. Aí eu não sei quem contou pra ele lá. Quando ele chegou em casa com o chapéu na mão, correndo (que ele nunca usou condução)... A condução dele, graças a Deus, sempre foi as pernas. E hoje, agora pra frente, sim, que ele de vez em quando pega um carro, uma carona, qualquer coisa, mas antigamente não. Aquela história que você tava contando sobre o Alfredo Vieira, o meu pai é uma prova, testemunha. E ele também participou. Quando saiu pra pesca da tainha, ele não tinha bicicleta, não tinha nada. Era na sola do pé. Ia pra Toninha, ia pra Enseada, ia no Perequê-açu. No pé mesmo! Então, ele, nesse problema dos presos, ele veio quando soube. Colocou o chapéu na mão, e, veio que veio tirando, embora pra casa. Chegou aqui todo apavorado, contando tudo e pá! E todo mundo naquele silêncio. Inclusive, até umas horas da noite, que a gente morava do lado da chácara, era vizinho do seo Camilo Manoel, e... E chegou a noite, quando começou aquela... o pessoal... os presos invadindo pro  lado da cidade e os soldados procurando pegar, né? Prender os presos. Até por trás da casa passava soldados, ou preso correndo, naquele tropé, batendo o pé e... pá, pá, pá. Nessa época que...
M.H.: Nós, nessa hora, estava no Perequê-açu, em cima de uma casa, quando a dona Suzana chegou chamando o marido: “Ai, vamo embora! Vamo embora gente, por favor! Pelo amor de Deus! O  preso da ilha mataram uma trancada de gente na ilha. E vem uma escorta de preso armado aí dando tiro, morrendo gente por todo lado!”. Escorreguemo pela escada abaixo, e, olha [fazendo zip com as mãos] nós tudo! E quando chegou ali naquele morrinho da descida da prainha, no caminho do Perequê-açu pra cá, encontremo um sordado... poliça. Mas tava que não se aguentava mais. Se nós não faz bonito, nós ia... era morto na mão dele. “Nós viemo do serviço, no Perequê-açu”. “Vocês não são preso?”. “Não! Que preso?! Já viu preso trabalhar?”. “Não. Fala direito aqui pra nós”. Nessa hora chegou o poliça –o outro poliça. Prendeu esse. Foi embora pra cadeia – preso. No outro dia tocaro ele embora pra São Paulo. Se não é o homem, é capaz de nós ser fuzilado lá, de ele matar nós. Porque nós não podia fazê força porque ele tava armado, né? E queria, tentando, encostando o fuzil em nós. E queria saber. Nós falava pra ele e contava: “Nós não tamo sabendo de nada. Nós vem embora porque precisamo ir embora. Já acabemo o serviço”.
         Aqui não aconteceu nada com ninguém. Só aconteceu só lá na ilha; lá. Lá na ilha os poliça mataram um bocado deles lá. Eles mataram poliça. Pintaram o caneco lá, mas pra cá não deu nada não.

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