sábado, 21 de maio de 2011

Lida no bananal

                
         Tarde; meia-tarde. Os homens com seus “penados e roçadeiras” limpam o mato miúdo, tiram as folhas secas que abafam os caules e retiram as mudas a mais (“filha que suga a toceira”).  Somente pequenas aranhas saem apavoradas. Nem no cacho verdolengo tem tié, ou sanhaço, ou gracaí ou qualquer outro papa-banana.
         É quase tempo de “bardeá” os cachos. Primeiro devem ser cortados e deixados nas beiras dos bananais. Em seguida, todo mundo que está disponível, como num trilho de formiga, trança os “embigos” de dois em dois cachos e toca a descer até o lugar do embarque. Cena inesquecível: de alguns homens só se vê as pernas, pois o resto é como se fosse um único cacho. Parecem cachos gigantes andando pelas “grimpas, badejas e pirambeiras”. Repassam nos “caminhos de servidão” que bem distante já foram “carreiros, picadas e trilhas”. Agora, por enquanto, estão no ponto certo. Mas não tarda para chegar a tal de pavimentação para desequilibrar isso tudo.
         A condução sai “carregada até a boca”. Onde estava um monte de cachos, só restam “ingaços, imbigos e folhas murchas” que os cobriram. O dinheiro? A cada embarque eles recebem o valor correspondente ao do “corte anterior”. Isso significa que o produto é entregue sem nenhum preço fixado, isto é, dependendo da cotação no mercado da capital será a gratificação. Mas só será conhecido (o valor) no próximo embarque (geralmente mensal). Também se deduz que o caiçara confia demais, pois tudo é feito sem nenhum contrato escrito. Nada garante que o transportador-comprador voltará no próximo mês. Se não voltar... adeus trabalho, adeus produto. A “ética do fio de bigode” impera.
         “O dinheiro é custoso, mas o de comê tem de fartura”. Estão contentes pela gratificação do trabalho. Vai possibilitar a compra de “carosene, sá, banha, pilha pra rádio e frachilete, corte de fazenda pra costura de arguma peça de ropa, e, tarvez dê  ainda pra trazê pão de farinha de trigo”.
         Dos retalhos de bananais do meu avô Armiro, presenciei muitos embarques mensais de até 10 dúzias de cachos, mas muitos outros ultrapassavam de longe essa marca. Tudo isso só na praia da Fortaleza! É de crêr?
         Assim labutavam os caiçaras até a década de 1970.

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