quarta-feira, 2 de agosto de 2017

DE ONDE VEM A CHUVA?

Banana cera (ou banana marmelo) do quintal (Arquivo JRS)

                Em outras ocasiões eu já comentei do regime chuvoso de outros tempos no nosso município de Ubatuba. O normal era ter muita água no ano todo, os córregos estavam sempre correndo e eram piscosos. Quando essas águas límpidas passavam pelos terreiros, era a alegria da criação, principalmente dos patos. Dificilmente se via um lugar  – praia, sertão ou bairro – que não tivesse sua vargem, sua área alagada que fornecia taboa, junco, caxeta, traíras, acarás, bagres etc. para o nosso viver, para a nossa existência cultural.
                Pelos caminhos abundavam olhos d’águas, onde saciávamos a sede. Era água cristalina a brotar entre sapê, nos bananais e nos aceiros das roças. Quantos camarões (cafula, tamanqueira, vadio, lagosta listrada etc.) a gente perseguia nesses regatos!?! O Nhonhô Armiro, tomando um caminho na restinga, andava até uma bica e enchia mais de uma vez por dia a sua talha de barro que ficava num canto da cozinha. Eu, criança ainda, mesmo sem sede, toda vez que passava pela sua casa, fazia questão de pegar a caneca de ágata e tomar um gostoso gole daquela água sempre fresca. Dele ouvi pela primeira vez: “A água é a nossa melhor bebida, menino!”.
                Por estes dias, lendo um texto do Antonio Donato Nobre, um renomado pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, me  recordei dos cuidados do Nhonhô com a água nossa de cada dia. “Não quero, crianças, que vocês fiquem passando pela grota da bica. Entenderam?”. O assunto era a água, a ausência de chuvas que está assustando muita gente. De acordo com esse cientista, “a não chegada da umidade amazônica é uma das causas da forte seca na Região Sudeste. O que sustenta esta afirmação é o conteúdo de 200 trabalhos científicos publicados nas melhores revistas científicas”. E continua: “É vital fazer com que os fatos científicos sobre o papel determinante da floresta para o clima amigo e o efeito do desmatamento na geração do clima inóspito cheguem à sociedade e tornem-se conhecimento corrente”.
                O que este cientista disse reforça o que escrevi em outras ocasiões: o modelo dominante de agricultura, de pecuária e de silvicultura (pinus, eucalipto, seringueira...) praticado no país precisa ser revisto. Senão... de que adiantará supersafras, recordes na produção de celulose, de borracha etc. se não houver chuva suficiente para as regiões produtoras?
                Há um déficit de cobertura vegetal e as queimadas estão crescendo no Brasil. Não se forma umidade suficiente em mato ralo, em pastagens e canaviais. Ainda existe o agravante das ilhas de calor - nas cidades e zonas industrializadas -  que impedem a chegada de massas úmidas de outros pontos mais distantes. O resultado só pode ser este: a crise hídrica medonha.
                Por etapa, caso pudesse determinar em lei, eu faria o seguinte: primeiro revisaria o desmatamento desregrado. Depois, retomaria as margens dos rios para garantir o máximo de mata ciliar. Isto a gente pode fazer em nossa cidade!
                Também podemos acusar os destruidores dos nossos rios. São atos criminosos, ainda mais agravantes em tempo de rios secando. Trata-se de incoerência de governos, incoerência de turistas e incoerência de moradores que não valorizam a riqueza da nossa terra.

                Naquele tempo não tão distante, sentado no banquinho da cozinha do Nhonhô Armiro, lá na Praia da Fortaleza, a fala era esta: “Preste reparo no que vou dizer, menino: a chuva vem da água que sobe pro céu. E de onde ela sobe? Sobe das águas que  tem aqui em baixo. Por isso carece de muito zelo tudo isso. As bananeiras ajudam bastante, ajuntam água, sabia?”. E continuava a lição que se repetiu por tantas ocasiões. Eu aprendi assim.

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