terça-feira, 5 de agosto de 2014

A TARA

         
Praia Grande do Bonete, vista do Morro da Bidu (Arquivo JRS)
                       Olá, Gisavasfi! Que bom que você está seguindo o blog!

          Ainda no começo do século XX, quando nem estrada de rodagem existia ligando o nosso município com os outros vizinhos, a pesca e a roça ocupavam quase todo o tempo dos caiçaras.

          No tempo das tainhas, de maio em diante, todo mundo ficava afoito, à espera dos grandes cardumes. “Tempo de fartura aquele!”. O Adelino, da Praia Grande do Bonete, tinha uma grande rede, muito especial para os grandes cardumes. Todos tinham seus quinhões após os compensadores arrastos.

          Do outro lado da Baía da Maranduba ficava a Praia da Caçandoca, terra do Vovô Estevan Félix. Era costume do pessoal dali acender uma fogueira e produzir bastante fumaça avisando da chegada das tainhas, resultando na descida imediata das canoas e da rede liderada pelo Adelino. Também em ocasiões de festas, eles se comunicavam com sinais de fumaça.

          Devido à religiosidade do meu povo caiçara, a cada lance de tainhas, a maior delas, chamada de tara, era separada e vendida. O que se arrecadava ia para a santa (ou santo) que protegia o lugar, que era festejado na praia ou dava nome à capela. No caso da Praia Grande do Bonete, além de São Sebastião, em janeiro, também se festejava Sant’Anna em julho.

          Um dos companheiros de pesca do Adelino era o João da Vargem, cuja amante era a Santana, gente do Jacundino da  Caçandoquinha. Ele não perdia nenhuma ocasião para uma visitinha rápida. “É para tirar o atraso, né?!”.

          Após o lance do cardume na praia da Caçandoca, conforme o costume, o Adelino jogou a maior tainha na proa. “Esta é para a Sant’Anna”. E saiu para um gole de cachaça na Armazém do Zé Félix, o tio do vovô.

          Ao chegar na canoa e ver aquela bitela separada na proa, o João da Vargem quis saber para quem era. De pronto escutou: “O Adelino separou para a Sant’Anna”. No instante ele pensou: “Ah danado! Então ele também está querendo a mesma mulher?! Eu vou antes dele levar esse peixe!”. E assim o fez.

          Ao voltar para a canoa, notando a falta da tara e perguntando aos companheiros, esta foi a resposta: “O João da Vargem levou para a Santana. Você não falou que era para ela aquela tainha?”.
 

          Que confusão! Daquela vez a santa não levou a melhor tainha. Quem saiu ganhando foi a fogosa Santana da Caçandoquinha.

Nenhum comentário:

Postar um comentário