segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

TERRITÓRIO E TURISMO

Mosaico  02 (Arquivo JRS)


Relendo o trabalho da colega Carmen Calvente, lembrei-me dos bons momentos que passamos trocando considerações acerca da cultura caiçara, dos desafios que fazíamos a nós mesmos conforme íamos entendendo melhor os fatores causadores de tantas transformações no espaço do litoral norte paulista. Naquele tempo, há mais de vinte anos, a pequena Bruna se divertia no jundu da Praia da Fazenda enquanto o nosso grupo (Carmen, Vladimir, Luís, Mary, Solange...) se debruçava no estudo do meio, sob orientação da professora Nídia Nacib, irmã do saudoso mestre Aziz Ab’Saber. Eis mais uma contribuição dessa amiga:

Com o turismo, ocorreu um processo acelerado de valorização das terras e de especulação imobiliária. Estas terras passaram a ter valor de troca (tradicionalmente, tinha apenas valor de uso), No início do processo muitas posses foram vendidas por valores mínimos, sendo que os caiçaras estavam pouco habituados às relações capitalistas ou a conviver com valores monetários, pois quase todas as necessidades eram satisfeitas pela produção familiar. O turismo penetrou como especialização; outras atividades econômicas (como a pesca), passaram a ser abandonadas e até consideradas entraves à modernização, inclusive pelos poderes locais.

As posses que continuaram nas mãos das famílias caiçaras foram diminuindo e aumentando de valor. Os que ficaram sem terra passaram por um processo de proletarização, e, como mão de obra barata, piorando as condições materiais de existência, ao mesmo tempo que aumentava a informação e o apelo com relação aos bens de consumo.

As comunidades caiçaras passaram a ficar concentradas em determinados locais. Mesmo nestes locais, na maior parte dos casos a faixa beira mar foi vendida e cada vez mais os pescadores, passando a morar nas encostas, sofreram dificuldades para transportar o equipamento de pesca até a beirada do mar, pois as residências de veraneio são construídas muradas, diferentemente das residências tradicionais.
[...]
No litoral norte, nesse momento alvo de uma destruição ambiental sem precedentes, ocorre pressão de grupos ambientalistas e são criados Parques Estaduais, inclusive o Parque Estadual de Ilhabela. Ao mesmo tempo que são limites para a especulação imobiliária, para os caiçaras esses Parques representam a perda do território, pois aumentou a impossibilidade material de praticar atividades tradicionais como a roça e a caça, sendo que esses limites também foram surgindo na beira mar: as novas residências construídas muradas, fechando o acesso à praia e dificultando a pesca. Além da impossibilidade material ocorre também uma mudança cultural: a pesca artesanal e a roça deixam de ser atividades atrativas para os mais jovens. 

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