domingo, 18 de agosto de 2013

CONVERSANDO COM UBATUBA

        
Muro na Rua Paraná, no centro de Ubatuba. (Arquivo JRS)
       Olá, Érika Quadros! Seja bem-vinda!

     O primo João Barreto deixou a roça (na Praia da Fortaleza) muito cedo para vir trabalhar com o tio Zequita. Ele - João - também gosta de escrever, sobretudo a respeito das lembranças do nosso lugar, quando os limites eram menores porque os habitantes eram poucos. Talvez fosse o mesmo sentimento do compositor do hino da cidade ao escrever "que fique guardada com tudo quanto tem". Com algumas adaptações, eu apresento este texto bastante revelador de outros tempos.

       Olá minha querida Ubatuba. Como está mudada, tão diferente! Lembras quando a conheci? Você era tão bonita, tão cheirosa; com suas matas em flor, seus manacás... As cercas que demarcavam suas terras eram feitas de bastão ou mimo. Lembra?
Onde estão suas "ciosas" ou mesmo as magnólias? Onde estão suas aroeiras e pixiricas, frutos preferidos dos bem-te-vis e sabiás? Deram lugar ao campo de aviação, não é?
Você era tão perfumada. As flores que cercavam seus arredores exalavam um perfume doce. Quando a gente acordava de manhãzinha sentia aquele perfume gostoso (quantas saudades!).
Lembras do Rio Grande? Que beleza! Suas águas eram limpinhas e cheias de vida; camarões, lambaris, carás, tainhas, robalos... Da Esquina da Máquina pra cima já era o Mato Dentro e todos se serviam de suas águas para beber, lavar roupas, tomar banho, e, no verão era a diversão das crianças que mergulhavam, andavam de canoas, pulavam do barranco, se jogavam de um cipó dependurado em uma árvore, enfim, tudo acabou e confesso que tenho saudades.
Lembra da Praia do Itaguá ou mesmo a do Centro, por ali onde fica hoje o parque, lembra? Ali, o Lâmpio, o Gerra, o Alfredo Vieira, o Fifo e tantos outros davam cada lanço de obeba da galha amarela, gonguito, maria-mole... que dava gosto da gente ver. Eles faziam aquelas fieiras e saiam vendendo ou trocando por farinha ou banana. Todos compravam sem receio de poluição ou contaminação.
Ali, quando a maré vazava, na nova ou cheia, lá íamos afinar a sola dos pés para cavoucar o marisco sapinhauá e o pregoá, para comer com banana verde. Como era bom aquele tempo!
Lembro também dos grandes lanços de tainha, e teve uma época que tinha acabado o sal na cidade, e, daquela tainhada toda só se aproveitava às ovas. Imaginem que fartura!
Havia dificuldades. Não existiam transportes adequados e as estradas de ligações eram precárias. Não havia linha de ônibus; o que tinha era uma JARDINEIRA, de um senhor com nome de Pacheco que transportava o pessoal daqui para Caraguá, Taubaté e vice-versa. Era difícil, realmente, mas mesmo assim tenho saudades!
Tenho saudades daquele tempo. Tempo em que se tinha mais liberdade; o povo era mais irmanado, mais amigo, mais respeitoso, mais religioso e mais festeiro. Lembro das festas, das danças, das brincadeiras, enfim do seu folclore; tudo tinha muita beleza.
Hoje o progresso chegou e tudo mudou. Mudaram suas festas, suas pescas. Poluíram seus rios, cortaram suas matas, sujaram seu mar... Onde estão os GONGUITOS, os PARATIS-BARBUDOS, as TAPERÁS, os MEROS e as CARANHAS que o Zeca Pão ferrava com sua linha de tucum? Onde está a laje na Boca da Barra que o Sidônio tirava marisco preto para comer e vender? Onde estão os AMBORÊS e GUAIAMUS dos mangues que eram limpos e não tinham óleo e nem esgoto?
Corta-me o coração de lhe ver tão desprezada, eu que lhe conheci tão bonita, tão gostosa, com tanta saúde... Corta-me o coração ver você assim!!!
Ubatuba!!! Que o progresso venha para você com consciência, de forma controlada e planejada. Que você seja tratada com carinho, respeito e dignidade pelas autoridades, pelos políticos e pelo povo desordeiro que aqui chega devastando, carecando suas montanhas, cocozando seus rios, xixizando suas praias.
Mas não tem nada, minha querida Ubatuba! Sei que você é forte, é valente e que vai superar tudo isso. Pedirei a Deus que a cubra com seu Manto Sagrado e que seus filhos olhem por você.

Autor: João Barreto Mesquita

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