terça-feira, 10 de julho de 2018

DISSERTAÇÃO DE TICO-TICO

Tico-tico (Imagem da internet)


               Não sei dizer de onde o finado Santinho Barreto, irmão do também finado Tião Honório, ainda quando morava na praia da Enseada, em Ubatuba, tirou esta expressão: “Dissertação de tico-tico”.
               Tico-tico é um passarinho que, no meu tempo de criança, abundava nessas paragens. O seu canto é muito bonito; a sua penugem até se confunde com a do pardal, mas tem um topete que o distingue. Apesar de cantar bonito, não era costume dos caiçaras manter tico-tico engaiolado. Isto eu só vi na cidade do Rio de Janeiro, nos seus subúrbios. O oposto, nesta terra de caiçaras, perseguidos eram os coleirinhos, os sabiás, os pintassilgos, os curiós, os canários etc. Mas na minha casa nunca tivemos esse hábito. Passarinho vivia livre, cantava para nós à vontade.
               Hoje quase não se avista mais tico-tico. Desconfio que os pardais e chupins são os responsáveis pelo sumiço. O canto do tico-tico parece uma falação melodiosa. Você já ouviu? Pode ser por isso que, escutando o Celino “Carioca” esbravejar constantemente contra os desmandos da ditadura no meado da década de 1970, o Santinho, um caiçara que adorava pescar garoupa nas costeiras mais próximas, assim se expressou: “Cuidado, Selino! A sua fala pode ser levada a sério por gente que não é caiçara. A coisa pode ficar feia para o seu lado. Esse assunto atrai gente perigosa, não é dissertação de tico-tico”.
               A advertência do Santinho eu presenciei no campinho da Enseada, do lado oposto do rio, onde se localizava o Bar dos Inocentes. Há muito tempo esses locais (bar e campinho) não existem mais, pois as casas de veraneio e prédios tomaram-lhes seus espaços. Mas era ali o nosso campinho, perto da rodovia, defronte da casa do Onofre Socca, um funcionário do D.E.R (Departamento de Estrada de Rodagem) e pioneiro na abertura da SP-55, a estrada que liga Ubatuba a Caraguatatuba desde a segunda metade da década de 1950.

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