domingo, 17 de junho de 2018

ANARRIÊ

Mestra Laureana (Arquivo JRS)

Mestre Élvio (arquivo JRS)

Mestre Ostinho (Arquivo JRS)

         A amiga Rosa participa da comunidade católica da praia da Lagoinha, onde,  entre outras coisas, se destaca a Quadrilha do  Mestre Tonhão. "Estou ensaiando a dança da quadrilha, com o Tonhão, Zé".

         A dança da quadrilha,  bem tradicional no nosso litoral no mês de junho (nas Festas Juninas), na comunidade citada acima, é ensaiada pelo amigo Tonhão que, desde que veio de Minas Gerais se engajou na comunidade que ainda estava em formação. E assim, a cada ano, acontecem ensaios, apresentações na festa da capela (São Maximiliano Kolbe), nos outros bairros e até mesmo em outras cidades. "Legal, né Rosa?!? Agora, pelo que sei, apenas duas quadrilhas continuam empolgadas no nosso município: a de vocês e a do Itaguá, onde Mestre Élvio se esmera com a turma da comunidade. Ah! Tem também a Caiçarada do Cortiço, os herdeiros do Velho Rita!".

        Adoro dançar quadrilha! Quando criança até ganhei um prêmio pela dança bem caipira. Na verdade, eu e minha dama (Kátia Coimbra) ficamos bem contentes pelo guaraná e sanduíches daquela ocasião. Pena que essas nossas tradições (quermesses nas capelas, arraiás nas escolas, comidas típicas, leilões etc.) estejam se apagando. Me alegro quando aparece no radar caiçara gente retomando coisas da nossa terra. Agora, por exemplo, tem os grupos de fandangos na região central e no norte. Me afiançou o primo Ostinho: "A criançada do Prumirim, herdeiros do Mestre Orlando, estão empolgadas nos ensaios. Você precisa ver, Zé!".

         A dança de quadrilha deriva das danças aristocráticas realizadas nos palácios europeus. Veio para o Brasil junto com a Corte, em 1808. A maioria das suas marcações ainda trazem traços da língua francesa. Quando criança, na escola do Perequê-mirim, ouvia o Mestre Altamiro (e depois o Mestre Dito Carneiro, a Mestra Alice e a Mestra Lúcia da Bá) comandando a coreografia: "Avantu" (en avant tous): de ir para frente; "Anarriê" (en arrière): ir  para trás; "Changê" (changer/ changez): trocar o par; "Otrefoá (aute fois): repetir o movimento; etc. As outras marcações (Caminho da Roça, Caracol, Grande Roda, Olha a Chuva, Coroa de Rosas, Coroa de Espinhos etc.) são bem nossas, da cultura brasileira mesmo! E o casamento na roça, gente! Tem outra encenação mais gostosa e tão à vontade ?!?

          Houve um tempo em que, em todas as escolas, a Festa Junina era a marca principal. Era o Evento! Havia competição e empenho de todos, sobretudo das famílias dos alunos. Hoje, conforme o amigo Manoel: "Ninguém tem animação. Poucos alunos querem ensaiar porque são evangélicos, os pais não permitem. Também há professores que, por motivo religioso, não se comprometem nessas manifestações populares. Muitos dos pais nem comparecem em outros eventos da escola, imagine em festa junina!".

         Apesar do notório anarriê, tem gente sustentando as coisas, fazendo despontar novos sinais no nosso radar caiçara. Grande força, Mestra Laureana! Grande força, Mestre Tonhão! Grande força, Mestre Élvio! Grande força, Mestre Ostinho!

               À minha filha e o meu filho, uma pequena parcela do ser caiçara: estudem bem, vivam o melhor possível sem perder de vista a nossa identidade, o nosso lugar e a nossa família.

Nenhum comentário:

Postar um comentário