quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

SERESTEIROS CAIÇARAS

O primo Elias e seu cavaquinho de tantas cantorias (Arquivo JRS)


                Na minha infância, vivendo na pequena comunidade da Praia da Fortaleza, dentre muitas coisas prazerosas, havia os momentos musicais. Isso acontecia ao se findar o serão, quando um a um dos parentes iam se arrumando num círculo na areia do Porto da Capela. Era a nossa Roda Musical!  Jorginho tocava violão, Elias se animava no cavaquinho, Jovane ritmava no pandeiro, eu, batendo no agogô do Tio João, acho que “não fazia feio”. Tinha ainda o Toninho do Dário e seu bandolim, Tio Maneco Armiro e sua rabeca, Maurício da Praia Grande e mais um violão, Elizeu no atabaque, Ricardo no chocalho  e... Ah! Sempre chegava mais alguém!
                Eram rapazes, moças e gente mais idosa que ficavam nas belas noites enluaradas, até “tarde da noite” no dizer da Vovó Eugênia, entoando gostosas músicas aprendidas dos mais velhos ou pelas ondas sonoras dos rádios de pilhas. Por volta das 22:00 horas tudo já era silêncio naquele pedaço de chão, pois os corpos precisavam descansar para um outro dia que ia chegando com suas tarefas.
                Me inspirei para este texto após ler a descrição de um diálogo entre um bêbado seresteiro e um padre, na obra Incidente em Antares, de Érico Veríssimo:

                - Não repare, mas estou num porre medonho... mal me aguento nas pernas.
                - Por que não vai pra casa? Se quer, eu o acompanho...
                - Não, padre, muitas gracías. Vou esperar o nascer do dia. Quero fazer uma serenata pro  sol, já que fiz tantas pra lua. E vai ser a última da minha vida.
                - Por que a última?
                - Ora, com essas músicas loucas que andam por aí, não vale mais a pena um vivente cantar as modinhas de antigamente. Ninguém mais aprecia. E quer saber duma coisa? Vou enterrar meu violão.
                O padre sorriu:
                - Não faça isso. A gente não deve nunca enterrar as coisas que ama.

                Infelizmente, por falta de reflexões em torno da nossa identidade de caiçaras, influenciados pelos programas televisivos, por outras crenças e devido ao avanço dos  turistas sobre nossas terras, o nosso grupo se desmoronou. Ah! Que tristeza!

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