segunda-feira, 14 de abril de 2014

NEM AS COBRAS

"Envelopes de cobrinhas"    (Arquivo JRS)

              Zorandir Soares: seja bem-vindo ao blog !

       Quando se é criança, a  gente faz coisas inacreditáveis. Imagine, então, para quem foi criado cercado por matas, rios, costeiras, praias e um mar imenso nos convidando a qualquer instante para um mergulho ou uma pescaria.
        Quando brincávamos num morro cheio de pedras ao lado de nossa casa, escutávamos a mamãe gritando: “Saiam daí, vão brincar pra outro lado. Vocês não sabem que aí  está cheio de cobras? Não escutam sempre, na noite, os pios delas?”. Ah! Era como se não falasse com ninguém! Imagine se na empolgação da brincadeira, pulando pedras, criando pontes de madeira etc. alguém iria dar atenção às preocupações da mamãe!?!
         É isso mesmo! As cobram piam. Porém, eu nunca li em lugar algum que elas fazem isso. Elas piam como os passarinhos. Só que é um piado solitário, ou seja, você escuta um pio, depois de um breve tempo vem outro e assim por diante. Mamãe explicava que elas piavam para atrair os pássaros da noite, sobretudo aqueles que eram perseguidores de filhotes. Papai dizia que elas estavam namorando. “Que nada! É conversa de namoro delas! Logo logo tem ninhada delas por ali!”. Assim, altas horas da noite, quando o silêncio imperava, eram comum escutar, não longe da nossa casa, os piados delas. Então, tinha razão a mãe preocupada ao nos ver se tecendo por aqueles lugares, pelos buracos e tocas formadas pelas pedras.
          Não tinha jeito, de nada adiantavam as advertências da mamãe. Até que um dia...Estando naquela corrimaça, brincando de esconde-esconde, avistei umas coisas parecendo sementes murchas de jaca. Juntei uma mãozada e levei para o quintal, onde mamãe estava estendendo roupas para quarar. Fui logo perguntando sobre aquilo. “O que é, mamãe? Achei ali, perto da casa da Maria Caçuroba, atrás da pedra”. Que susto dela. “Largue isso, menino. Não tá vendo que é ovo de cobra? Pega já a enxada para dar um fim nisso”. E chamou todos os demais que brincavam por ali. “Agora vocês entendem porque eu estou sempre preocupada quando estão brincando pelas pedras dali?”.

              Coitada da mamãe cobra. Ficou sem os filhotes.

        Coitada da mamãe. Nunca nós deixamos de brincar em nenhum lugar por medo de cobras.
             
              Nem as cobras podiam com a gente. Essa era a verdade.

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