quarta-feira, 16 de março de 2011

“Ande logo”

Em dezembro arrumei um tempinho para visitar o Mané Hilário. Creio que é o mínimo que devo fazer para agradecer pelas tantas oportunidades que este ubatubano me deu para crescer e entender melhor a nossa própria cultura. Neste mês (1º de dezembro) é aniversário dele: completou 102 anos. Ele e o Fidêncio (do Sertão da Quina) são os caiçaras ubatubanos  mais antigos.
                Apesar da saúde bem fragilizada, encontrei-o bem disposto. Afinal, era o momento do café; sua neta e a nora cumpriram um ritual com muita dedicação. Depois, numa cadeira de rodas, aqueles olhinhos brilharam conforme íamos lhe puxando pela memória. Quis saber de alguns parentes da Maranduba, sobretudo do tio Hilário do Prado; misturou alguns nomes; se lembrou de antigas namoradas. O que mais me emocionou: fui contemplado por alguns versos de Reisado e da Cana-verde.
                Há alguns anos, sempre que eu o encontrava sentado no jundu, olhando a praia, também fazia o mesmo e começava a especular sobre um monte de coisas da vivência dele. Quero dizer que ainda não perdi esse costume. Não me esqueci de uma frase dita há muito tempo por Mané Hilário: “Sei que o meu corpo é muito limitado. Pode ser que não terei tempo de ir muito longe. Também, se tiver tempo, é a força que me faltará. É assim a vida, né?”.  Desta ocasião ainda trago uma adivinhação para desvendar: “Me diga o que é, Zé: seis mortos espichados, cinco vivos passeando; os vivos não dizem nada. Os mortos estão falando”.
                Por fim, já percebendo o cansaço do nosso querido personagem, quando me preparava para deixá-los, a neta dele, Magali, fez a seguinte pergunta para demonstrar como o velho caiçara é apaixonado por peixe (a preferência sempre foi por peixe seco assado com café amargo):
                 - Vô, quer comer peixe hoje?
                Depois de um breve silêncio, recebeu a seguinte ordem do antigo caiçara ubatubano:
                - Ande logo!
                É isso. Viva os 102 anos do Mané Hilário! Parabéns! Parabenizo também os familiares que continuam se preocupando com “o nosso caiçara do coração”.

                Sugestão de leitura: Os pobres na Idade Média, de Michel Mollat.
                                                                                              Boa leitura!

Um comentário:

  1. Olá, professor!
    Aqui é o Bruno, seu aluno do terceiro ano do objetivo.
    Caramba, 102 anos? quem me dera se eu chegasse até essa idade, hem? Rsrs..

    Professor, eu tenho um blog há mais de meses: blogdobrunobarbosa.zip.net. Se quiser entrar e ler alguma coisa, seja bem vindo.
    Não sei se é de sua vontade, mas, em meu blog, posso divulgar o seu blog, pois você resgata a cultura e os verdadeiros caiçaras da região, e isso é muito importante e deve, sem dúvida, ter uma atenção especial.
    Até mais!

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