quarta-feira, 7 de outubro de 2020

A LAVOURA

 

Bito Madalena (Arquivo JRS)

             Escrever sobre lavoura no chão caiçara é enxergar ainda os espaços cultivados. Era assim na minha infância, quando a especulação imobiliária engatinhava no litoral paulista. Em época desta, quando chegava a primavera, as roças novas recebiam as primeiras atenções, sobretudo no controle do mato que sempre vinha com muita força. As saúvas também exigiam vigilância constante. Na  várzea do Sapê, vovô Estevan plantava arroz e milho entremeados com as bananeiras. No morro da Fortaleza se cultivava muita mandioca nas posses do vovô Armiro.  Me lembro sempre de uma prosa em outro tempo com o estimado Bito Madalena, no alto do morro do Saco dos Morcegos, quando ele me explicava: 

         "Todo esse mato daí, por esses morros todos, na metade do ano era preparado para novos plantios. Tudo era descultivado nessa época. Só ficavam livres as capoeiras que descansavam anos até chegar outro tempo para mexer nelas. Era chão de pousio. 

       Todos precisavam da lavoura. Quem vivia sem farinha? Quem passava sem banana, cará, batata,cana e outras coisas mais? Eu, meus parentes... todos tinham de fazer isso para garantir uma parte do sustento da família. A outra parte vinha da pesca e da caça. Todo mundo vivia dessa maneira. Sinto dó da gente de hoje porque quase tudo precisa ser comprado na cidade. De uns tempos para cá o nosso pessoal foi se acomodando em outras formas de viver, de ganhar dinheiro. Veja tudo isso! Naquele tempo quase não se avistava mata fechada assim; era plantação disso, plantação daquilo. E quantas casas desapareceram  engolidas pelo mato!? Os mais novos se foram e os velhos que ainda vivem não têm forças para enfrentar a lida da roça, dos bananais. Agora, repare bem, veja a quantidade de casas surgindo pelos morros e badejas. Tudo isso já foi chão descultivado, teve posseante zelando, cultivando de tudo um pouco. Logo ali em frente, do Teófilo para baixo, até alcançar a cachoeira, o Rio do Inhame, foi o pessoal de casa - meu finado pai e nós, os filhos - que descultivamos. Tudo virou um bananal só. Os barcos saíam carregados de cachos, levavam para Santos. É por isso que este lugar adiante, até a virada de lá, tem o nome de Saco das Bananas. Antes era só Prainha do Frade".

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