segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

AS RUÍNAS (II)

Ruínas nas Galhetas (Arquivo JRS)


                De vez em quando alguém entra em contato comigo para saber a respeito das ruínas no município de Ubatuba. De algumas delas eu já escrevi, dei a minha contribuição, mas sempre tem novidades para quem vasculha textos e escuta a prosa dos mais experientes. Hoje, a partir do documento de Félix Guisard Filho, está em questão a ruína da Tabatinga, que muita gente sequer imagina que possa existir. Acredito que este assunto ainda possa interessar a alguém. Espero!
                A antiga Fazenda Tabatinga estava localizada perto da farta queda d’água que vinha da Serra da Lagoa. Atualmente corresponde ao entroncamento da Estrada das Galhetas [corvo s marinhos], de onde parte a Estrada da Lagoa. O mato cobriu a área, as pessoas jogam lixo e as colunas e paredes estão esquecidas. Quem sentirá a falta desses monumentos caso alguém se resolva por uma ação criminosa, contra o patrimônio cultural?
                Em 1838 houve diligência ao local após denúncia de ser referência no contrabando de escravos, quando a Inglaterra fazia de tudo para acabar com o tráfico dos negros africanos. Com adaptação minha, vamos ao documento da época:

                Aos treze dias do mês de março de mil oitocentos e trinta e oito, nesta Secretaria de Polícia, compareceu Euzébio José Rodrigues de Freitas, negociante, morador na rua Formosa, da Cidade Nova, nº 22, e em virtude do despacho desta, em sua petição foi-lhe tomada a denúncia seguinte: que na fazenda denominada Tabatinga, próxima da Ilha de São Sebastião, cujo proprietário José Bernardino de Sá, morador nesta Corte, está presentemente sendo um dos mais frequentados pontos de desembarque de africanos boçais, e que ultimamente ali aportaram, em janeiro, dois barcos carregados deles. Indignadas algumas pessoas das vizinhanças reuniram-se com armas para dispersá-los, e fazer, com isto, que tais contrabandistas deixassem aquele ponto, cuja frequência já se tornou escandalosa.   Disse mais: que o dito José Bernardino, para melhor fortificar-se, ali havia construído uma espécie de forte de madeira, guarnecido de doze ou treze colonos, e muitas outras pessoas de artilharia para defender o desembarque de seu contrabando. Outrossim declarou que estava a chegar ali o brigue escuna-paquete de Luanda, outrora Espadartes, que é pertencente ao mesmo Sá, com nome suposto, cujo brigue é guarnecido por duas peças [canhões] e um estandarte que é desmontado e oculto no porão logo que aqui entra. E dando por concluída a denúncia, assinou o presente termo por achá-lo conforme. Euzébio Roiz de Freitas. Joaquim M. Maia.

                De acordo com a data, levando-se em conta que o Porto de Santos era suficientemente vigiado pelos ingleses, é fácil de entender essas empreitadas para o contrabando. A propósito, o referido José Bernardino tem história nisso. Clóvis Moura, em Dicionário da Escravidão no Brasil, cita-o:

                “José Bernardino de Sá iniciou sua carreira como empregado de uma loja no Rio de Janeiro, mas, em 1830, quando o tráfico estava se tornando totalmente ilegal, já estava embarcando escravos para o Brasil em seu próprio navio, o Amizade Feliz. Três ou quatro anos depois, agora dado como uma herança que ele investiu no tráfico, Bernardino de Sá estava instalando postos escravistas na costa africana ao sul do Equador, onde os portugueses ainda mantinham um tráfico legal e os cruzeiros britânicos normalmente não intervinham. Fazendo escambo de tecidos na África e utilizando a bandeira portuguesa para proteger seus navios de captura pelos britânicos, o jovem negociante logo ficou rico, famoso e com títulos”.     

                Assim, que tal conhecer e lutar pela preservação de nosso patrimônio cultural e torná-lo mais uma fonte de turismo?

2 comentários:

  1. Fico feliz por saber de mais um patrimônio histórico na região mas fico triste em saber que nossos governantes não dão a mínima para o passado e nem pela história.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Trata-se de uma opção educacional que não contempla o turismo cultural, nem a preservação do patrimônio cultural.

      Excluir