domingo, 20 de novembro de 2011

Se não fosse o Totô!


Guaiás capturados na maré baixa para sustento de caiçara- Júlio 2011

                Já escrevi em outras ocasiões a respeito do João Pimenta, o incréu. Era da nossa vizinhança, na praia do Sapê, onde eu nasci.      Deste pequeno comerciante, o que mais me marcou foram os “bate bocas” (debates) que estabelecia com o frei Pio e mais uns dois ou três moradores do lugar. Eram disputas teológicas, mas eu não sabia disso naquele tempo. Meu pai não participava ativamente de tais conversas, mas as escutava e depois comentava em casa vagamente do assunto. Dizia no final: “O João Pimenta não é má pessoa, mas é incréu!”.
                 Numa dessas arengas, me recordo bem, o tema era o poder do Papa, da tão distante Roma. Frei Pio dizia que “o homem” era o “representante de Deus na Terra, o prenitudo potestatis”. João retrucava que tudo era conversa para alguém lucrar com isso. Nié, o mecânico, se dizia “acreditar desacreditando”. Nisso, o bom Nestor, o nosso “Totô” deu um basta em tudo badalando o sino e gritando ao mesmo tempo em forma de bronca: “O pessoá tá se cansando de esperá o padre. Como é que é: tem missa ou não tem?”. Não restou outra alternativa: lá se foi o influído frei Pio no seu hábito marrom que há muito se revelava encardido. Só não descobri até hoje se era parte da liturgia um hábito do frei: entrar na capela dizendo a cada fiel “Eticumespiritutu”. “Será que ele quer comer tutu?”. Eu tentava adivinhar o significado, fazendo as aproximações possíveis. De vez em quando o vovô Estevan ralhava, mas quase sempre dava uma risadinha. Acho que ninguém seguia perfeitamente o latim do frei, mas repetiam os sons nos momentos adequados.

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