quarta-feira, 12 de junho de 2013
ESPORTE E CIDADANIA
Quando
eu era criança, além das remadas, braçadas e correria no lagamar, pouca coisa
se falava na área de esportes em Ubatuba. Também nem televisão, revistas ou
jornais tínhamos.
No
domingo que passou (09 de junho), novamente eu acompanhei a Associação Nunes de
Karatê. O meu filho – Estevan – foi um dos atletas a viajar 250 quilômetros a
fim de aperfeiçoar o seu desempenho. Foi o XX Torneio da Amizade de
Karatê-do, em Arujá (SP).
Ao
todo foram dez atletas espalhados nas diversas categorias. E todos foram muito bem!
Raffaella
Rezende (ouro e prata), Maria Rosa Etzel
(bronze), Terezinha Maria (ouro), Alexandre Domingos (ouro e prata), Leonardo
Nunes (prata e bronze), Estevan José (ouro), Rômulo Marcondes (5º lugar), Ruan
R. Etzel (ouro), José Adriano (6º lugar) e Weider Nunes (prata). Mais
importante que as conquistas foi a oportunidade de convivência e de crescimento
de todos, inclusive dos familiares dos competidores.
Um
dos objetivos deste texto é agradecer aos pais dos alunos da Associação e
demais apoiadores: Rocha Sorvetes, Pelé (do Supermercado
Paulista). Mercadinho e Padaria São Bento e Castellar Engenharia,
cuja sede está em Curitiba – PR. Parabéns por acreditarem no potencial dos
atletas, ajudando a abrilhantar um pouco mais a nossa cidade, fortalecendo a
esperança de um mundo melhor!
Ah! Que legal! E pensar que os mais velhos, ao nos verem brincando de luta na fofa areia da praia, diziam: "É bom pararem com isso! Ficar aloitando à toa pode deixar vocês bacatudos, rendidos!".
terça-feira, 11 de junho de 2013
A TITIA BENZEDEIRA
Zé, coloque em seu BLOG :
A tia Terezinha há pouco nos deixou. Era a última tia benzedeira. Agora, na minha família não tem mais ninguém. As outras (tia Maria Mesquita, tia Aninha, tia Martinha, tia Apolônia...) já se foram faz um tempinho, “dentro do combinado”. Creio que era a única no bairro do Ipiranguinha. Não sei como vão se virar os muitos pobres que a procuravam com tanta esperança de serem aliviadas.
Disse Goethe: "NEM TODOS OS CAMINHOS SÃO PARA TODOS OS CAMINHANTES".
É verdade! E sendo assim, eu digo que O MEU CHÃO NÃO É DE TERRA, NÃO TEM TRILHO DE CAMINHO, NÃO TEM ESQUINA DE RUA E NEM RUA COM ESQUINA. O CAMINHO DE MEU CHÃO É O MEU PRESSENTIMENTO, SIGO O BRILHO DO SOL, VOLTO NO RASTRO DA LUA.
Julinho Mendes.A tia Terezinha há pouco nos deixou. Era a última tia benzedeira. Agora, na minha família não tem mais ninguém. As outras (tia Maria Mesquita, tia Aninha, tia Martinha, tia Apolônia...) já se foram faz um tempinho, “dentro do combinado”. Creio que era a única no bairro do Ipiranguinha. Não sei como vão se virar os muitos pobres que a procuravam com tanta esperança de serem aliviadas.
No
começo do ano acompanhei o caso do Beto, um pedreiro esforçado que havia
contraído leishmaniose no Pé-da-Serra, num serviço de manutenção por ali. Semanalmente
ele estava na casa da titia para uma sessão de benzimento. Tomava um café
depois de mais de meia-hora de rezas e imposições de mãos; nunca saía sem levar
uns matos para banhar a ferida feia que lhe roía o calcanhar. “É mosquito-palha
que fez isso, primo. Mas a titia vai curar”. De nada adiantava eu recomendar
que fosse ao Posto de Saúde procurar uma orientação do doutor Teófilo. “Para
mim, bastam a fé e o poder que a titia tem”.
Ontem,
pedalando pela estrada com uma caixa de ferramentas na garupa, encontrei o
Beto. Ainda estava com uniforme de trabalho, cheio de disposição de chegar em
casa, tomar um banho, encher a pança e descansar para enfrentar a luta que
continua a cada dia. Perguntei da ferida. “Já passou; só tem a cicatriz! Valeu
muito o poder da titia! Se não fosse as suas rezas e tudo aquilo que ela me
indicava eu teria perdido a perna. Agora, o que decidiu de vez foi a pimenta!”.
Como
assim? Pimenta? “É isso, primo. Por fim a titia me deu umas dez malaguetas e a
seguinte ordem: ‘Faça em duas vezes esse punhado. Amasse bem em cima de uma
pedra, acrescente um punhadinho de sal e coloque em cima da carne viva. O Nosso
Senhor vai te curar. Só não esqueça de agradecer depois’. E foi mesmo! Agora
não sinto nada! A fé da titia ajuntada aquele monte de mato e ao poder da malagueta
matou o veneno do mosquito-palha, graças à Deus!”.
sexta-feira, 7 de junho de 2013
ESTE MENINO VIVE DIZENDO HERESIA
Mestre Dito Fernandes também representa a religiosidade popular |
Neste final de semana acontece a festa no Sertão do Puruba, na Comunidade Católica que tem Dito Fernandes, dona Mocinha, Pedro Brandão e tanta gente de raiz caiçara. Espero que muita gente possa desfrutar das atividades, especialmente da Congada que só ali tem. Por isso reaproveito um texto antigo (mas nem tanto!) para permitir reflexões acerca da cultura popular, da criatividade dos pobres no cultivo da esperança.
O título - Este menino vive dizendo heresia - vem de uma frase é do saudoso tio Maneco Mesquita, um caiçara que se preocupava muito com a imagem, com a sua aparência pessoal. Explico melhor: nunca se viu ele sair de casa sem estar devidamente vestido (roupas passadas, sapatos brilhantes, chapéu impecável, lenço no bolso etc.). Nesse caso, ele se referia ao meu primo Fernando, só que não me recordo mais do contexto, porque foi que ele afirmou isso. Só a palavra heresia me interessava. O tio Clemente foi o meu socorro.
Com a paciência que lhe era peculiar, o titio, um santista devoto, admirador fanático do Pelé, me explicou que heresia era uma palavra grega; queria significar escolha, preferência para discordar de alguma coisa. Então eu deduzi que o Fernandinho, vulgo “Chico Pomba”, era alguém questionador.
Mais adiante, outro tio – o Tonico – deu a segunda versão: heresia era um pensamento religioso diferente da doutrina da igreja católica. Herético era aquele que merecia ser perseguido e punido porque não aceitava os dogmas da Igreja Católica Apostólica Romana.
O meu raciocínio neste assunto deu outros passos conforme eu cresci, fui lendo e estudando. As pesquisas históricas e a literatura me ajudaram muito. Foi quando eu passei a imaginar os meus antigos passando por apuros caso vivessem em outra época, próximo dos inquisidores e de seus tribunais que apreciavam a morte pela fogueira. O que seria das imprecações maravilhosas do Mané Bento? E as benzimentos da tia Aninha, da tia Maria, da dona Josefa, do Mané Mariano e de tantos outros? Como terminaria a tia Maria da Barra que ensinava o catecismo dizendo que Jesus tinha dois apóstolos por nome de Judas: o "Matadeus" e o "Carioca"? E o João Pimenta, o “incréu”, com o seu linguajar herético, que fim teria? Da religiosidade popular, então, nada seria permitido!
Desconfio que muitos desses caiçaras se desesperariam em saber que uma tal de Joana D’Arc, depois de acusada de heresia, foi queimada viva em trinta de maio de 1431, na França. Nem sei se, devido ao isolamento no qual vivíamos, eles souberam que, em 1920, o papa Bento XV a declarou santa.
Quantas heresias!
Ainda bem!
Ainda bem!
quarta-feira, 5 de junho de 2013
AO CANTAR DO GALO
Na madrugada, quando o escuro ainda toma conta do
mundo caiçara, os galos cantam chamando a manhã,
trazendo tantas recordações, inspirando tantas
poesias,inclusive esta do mano Mingo.
Antigamente era o canto do galo
nas fímbrias da madrugada
que franqueava os caminhos
às pessoas de bem:
pescadores partindo para o mar,
lavradores nas trilhas das roças,
ou viajantes partindo
(talvez por nomadismo atávico),
pois aqui não faltava peixe pra comer
nem água boa de beber.
terça-feira, 4 de junho de 2013
ZÉ DO CINEMA
Ontem, na madrugada, faleceu o amigo Zé Aparecido, o “Zé do Cinema”.
Natural de São Luiz do Paraitinga, o Zé era professor das séries iniciais, mas sempre teve um outro emprego para aumentar a renda. “Quem mandou ser professor?!”. O apelido se devia ao tempo em que trabalhou no antigo Cine Iperoig, na Praça da Matriz (Ubatuba), onde hoje se localiza o teatro. Lembro-me muito bem dele fazendo promoções, indo às escolas para anunciar o filme Carlota Joaquina, rainha do Brasil. A semana inteira a sala ficou lotada.
Para homenagear o amigo Zé, reapresento o texto a respeito da árvore que nós plantamos na escola Idalina (Bairro Ipiranguinha). Como seria bom se os moradores deste bairro e os alunos se voltassem para a ideologia preservacionista (em todos os sentidos)!
Era assim... |
Agora está assim... |
Dando estes deliciosos frutos. |
Cheguei agora da escola estadual do bairro (Idalina A. Graça). Aproveitei para recolher alguns frutos (cajá-manga) da frondosa árvore dali. Afinal, cair frutos era o previsível após o vento forte da madrugada. Outra pessoa fez o mesmo cálculo: encheu uma sacola e se foi.
Pois bem, é sobre a história desse pé de cajá-manga, que há muitos anos vem dando alegria às pessoas, que eu escrevo agora. Tudo começou em setembro de 1999, quando eu e mais cinco professores decidimos promover um gesto concreto, que marcasse a entrada da primavera. Iríamos plantar algumas árvores no terreno da escola para abrandar o calor em épocas quentes, oferecer sombras e frutos, dar mais equilíbrio no ambiente etc. Afinal, quem não prefere um espaço arborizado para quebrar a frieza e/ou feiura das nossas construções? Assim fomos até o amigo Arisson, no Monte Valério, escolhemos algumas mudas e plantamos no referido local (do bairro do Ipiranguinha). Um pé de jambo ficou perto do portão, em seguida vieram as amendoeiras perto de um pé de uva japonesa que já estava bem crescido. Eu decidi, juntamente com a finada Cleuza e o José Aparecido, que o nosso cajá-manga ficaria o mais protegido possível, perto da secretaria da escola. E ali foi plantado o ser que media 30 ou 40 centímetros. Era o dia 21 de setembro de 1999.
Ao longo desses anos todos, sempre vejo que as pessoas, sobretudo os meninos, aproveitam bem, apreciam os frutos. Estão constantemente vasculhando por sua volta. Ela, a árvore, cresceu muito. Agora, calculo que a gigante, distante do velho tarumã alguns metros, esteja alcançando os seus 15 metros de altura. Também tem um diâmetro considerável. Está linda! Deixa muita gente contente! Só um telhado construído recentemente está sendo castigado pelo impacto das frutas que despencam a partir da metade do outono. Outra coisa ridícula são as marcas deixadas em seu tronco por “seres sem-noção”.
Para encerrar: de acordo com quem produziu a muda, antigo funcionário da ONG WWF (Fundo Mundial para a Natureza), cuja sede era no Monte Valério, a semente primeira foi recolhido no terreiro da antiga Fazenda Velha, dos Irmãos Chiéus, os fabricantes da nossa pinga Ubatubana, aquela que deixou muita saudade. Pesquisando um pouco mais, descobri que a origem desta espécie está na Oceania, bem longe daqui. Então, não poderíamos chamar os navegantes portugueses de “ótimos polinizadores”?
É assim, meu amigo Zé! Ficam as lembranças dos bons momentos vividos em comum.
É assim, meu amigo Zé! Ficam as lembranças dos bons momentos vividos em comum.
domingo, 2 de junho de 2013
NORTE E SUL
Porto do Paru - Enseada (Arquivo JRS) |
Eu,
nascido no lado do Sul, nem fazia ideia do que era o lado do Norte. Só no final
da década de 1960, quando os meus tios começaram a trabalhar na A.S.E.L., com o
Frei Pio, foi que comecei a entender isso.
O
lado do Sul é todo mundo que nasceu desde a Toninhas até a Tabatinga; o lado do
Norte é todo mundo que está depois do Perequê-açu. Hoje parece não haver nenhum
sentido nessa divisão, mas antigamente...dependendo do que falasse ou fizesse,
lá vinha o dizer: “Também pudera, né? É gente do Sul!”. Ou: “Pelo falar só pode
ser do Norte!”
O
Sul, desde a década de 1950, estava conectado com o mundo. Ninguém mais falava
“vós mecê”. O Norte permaneceu isolado até a segunda metade de 1970, quando a
BR-101 alcançou Paraty. Porém, assim definiu bem o Olympio Mendonça:
“A
principal característica do povo caiçara desta região [Norte] talvez seja a sua
grande adequação aos movimentos da natureza que o cerca e envolve. Enfrenta os
problemas, ora com a calma de uma mata em repouso, ora com o furor de um mar
bravio. Aparentemente é tranquilo, equilibrado,
e pacífico; pode, porém, assombrar pela sua força e tenacidade.
“Aqui tem gente que quebra um homem ao meio
com um soco e não há mais quem endireita...Assim explicou um
caiçara...Mas que jamais se utilizou dessa força para a parte belicosa”.
Via
de regra, não blasfema contra as intempéries e se acomoda ao sol ou à chuva, à
fartura ou à carência, à sorte ou ao infortúnio. Enfatizando, quando enfrenta
os fenômenos naturais não força nenhum acontecimento, como bem atesta o verso
de um calango colhido no Ubatumirim,
em 1972:
“Peixe de lagoa é sapo/ bagre de mangue é
socó/ Tainha também é peixe/ mais não pega
no anzó./ Quando não qué pegá,/ não aforce que é pió”.
O
caiçara é, antes de tudo, um equilíbrio, uma adequação ecológica, um prolongamento
natural da natureza”.
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