quinta-feira, 13 de fevereiro de 2020

ERA TIO ISAURINDO, DEPOIS...


Capa de certidão (Arquivo JRS)

        Hoje o Dito Costa já é falecido. Nem sei dizer qual o rumo na história da sua esposa. Acredito que seus filhos, netos e bisnetos estejam bem, por aí. É assim… a vida segue... O que vou contar agora aconteceu já faz tempo, quando o referido casal e a criançada moraram no morro da Fortaleza, na nossa casa que ficou desocupada após nos mudarmos para o Perequê-mirim.

        Humilde como ele só, numa tarde, assim que me viu passando pelo terreiro, me pediu: “Avise o seu pai que hoje está para chegar o meu tio Isaurindo, mas não deve se demorar por aqui. Vem de Santos descansar e visitar a gente, trabalha lá, no porto, mas já está perto de se aposentar”. "Pode deixar, Seo Dito". Achei estranho, era a primeira vez que escutava nome assim. Na verdade, foi a única! De fato, no dia seguinte, lá estava o parente do Dito, bem diferente do sobrinho. Era conversador, sem nenhuma timidez, corado, cheirando a banho tomado… Brincava e caçoava como um bom caiçara. (Só que era caipira). Não sei o porquê, mas eu queria saber a razão do nome dele. Bem diferente, né? “Será que a mãe é Isaura e o pai Florindo?”, “E se for Isaltina com Laurindo?” etc. Fiquei pensando nisso pouco tempo, coisa de nada, pois criança tem coisas mais importantes para se ocupar. Alguém duvida?

       Bem mais tarde, já adolescente, quando eu trabalhava num bar, reencontrei o Isaurindo, aposentado, cheio de cabelos brancos e de rugas, bem avançado na idade. Então, na primeira oportunidade lhe perguntei:O senhor poderia me esclarecer uma coisa: Isaurindo tem ligação com Isaura? Por acaso, Isaura era o nome da mãe do senhor?”. Ou seja, cresci mas não deixei o costume de perguntar sempre. “Menino especulador, que quer meter o bebelho em tudo”, segundo a mamãe. No mesmo momento, ele pegou um pedaço de papel de pão que estava por ali, me pediu uma caneta e escreveu: E X A U R I N D O. Assim mesmo, em letras bem grandes! E emendou: “Não tem nada com Isaura! O meu nome é único e é lindo!. “Nossa! Agora que complicou mesmo!”. Com muita paciência ele tentou me explicar. “Exaurir é perder forças, se desgastar. Esgotar-se e outras palavras significando mais ou menos isso. O meu finado pai - que Deus o tenha! - me disse que eu ganhei este nome depois de ele ter escutado uma conversa de dois amigos brincalhões, meio que parentes dele, nossos. A fala do meu papai – que Deus o tenha! - foi esta: O Tonico e o Andrelino comentavam que o doutor Leão Nagib, deixou de lado a viuvez de muitos anos e se casou com uma mulher muito mais nova do que ele. Rindo demais os dois, esta foi a parte que diz respeito ao seu nome: ‘Ele está muito cansado, baqueado de dar dó. Quem não sabe que bainha nova não se dá com canivete velho? É certo que ela o está exaurindo. Quem não vê isso?’. Naquele dia, pelas mãos da comadre Donária, você nasceu. E aquela palavra, a tal de exaurindo, que eu achei muito bonita, me acompanhou até o lugar onde você foi registrado. O Elizur, dono do cartório da nossa Ubatuba, quis criar caso por causa do seu nome, mas até deu uma gargalhada depois que eu contei essa história, que era a justificativa; logo sacudiu os ombros, preencheu a papelada e me entregou a certidão válida na República dos Estados Unidos do Brasil. Após 'o referido é verdade e dou fé', ele assinou”.

    Que interessante! Na época, fiquei feliz e agradeci pela explicação. Não demorou muito para o Tio Isaurindo, digo Seo Exaurindo, nos deixar. Posso dizer que o Exaurindo se exauriu?

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