sexta-feira, 1 de abril de 2016

DEPOIS DA ESTRADA

Dia de farinhada (Arquivo JRS)

                Admiro as pessoas que têm facilidade para fazer poesias porque, quase sempre, de forma inusitada, dizem em poucas palavras o que longas reflexões deixam a desejar.

                A nossa terra, na nossa cultura caiçara, “tem uns pares de gente assim” que muito nos edificam. Alguns escrevem em seus espaços privativos, tal como os anacoretas em seus retiros. É o caso do estimado José Carlos, o Góis; outros estão no meio da multidão, na labuta que sustenta o cotidiano. O prezado Santiago, conforme vou acompanhando suas atividades, deixa antever de onde brota suas inspirações: da natureza e da vida em comunidade. Agora mesmo, tendo a imagem de seu grupo plantando no morro do Camburi, reflito um desapontamento com parte dessa nova geração do povo do meu lugar.

                Passando um dia na praia do Camburi, dei sorte de encontrar alguns caiçaras para conversar. Prosa é comigo mesmo! Quem me conhece sabe que eu adoro histórias (que é sempre, em qualquer lugar, a vida da comunidade). Algumas mulheres e apenas um homem que trabalhavam por ali assim narraram:

                “Hoje é dia de mutirão na comunidade. Já é dia fixo; todos sabem. A gente carpe os caminhos, aterra buracos, arruma cercas, cuida da cemitério, planta árvores e flores. É o nosso lugar, a gente vive aqui, né? Tem que ser um lugar bom. Pode ser mais bonito ainda. Mas somos sempre nós, estas mesmas pessoas que você tá vendo. Mas o nosso lugar tem bastante gente. Tem sempre alguém que sempre inventa alguma coisa para fazer na cidade, para deixar de comparecer neste nosso compromisso marcado em reunião da comunidade.


                 Nenhum jovem participa, mas eles sabem que é para eles mesmos, pra todos nós que nascemos e moramos aqui. Parece que sentem vergonha de serem pobres, de serem deste lugar. E tem mais: pensa que  eles sabem pescar, trabalhar na roça, fazer farinha?!? Essa geração nova não quer saber de nada disso. Morrendo os mais velhos, se acaba tudo. Se acaba o nosso jeito caiçara de viver, de aproveitar da vida. Essa gente nova quer se parecer com o pessoal de fora, com os turistas. Essa coisa foi chegando depois que passou a estrada”.  

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