quinta-feira, 19 de março de 2015

SABEDORIA NO JUNDU

Eu, Oliveira e Elias: prosa boa demais! (Arquivo JRS)

                Após quatro horas no Caminho de Servidão (trilha) desde a Praia da Lagoinha até a Praia da Fortaleza, passando pelo Cedro e pela Ponta, apreciando o Mar Virado e as límpidas águas esverdeadas, nós (eu, Jorge, Estevan, Solange e Elias) visitamos rapidamente o Ditinho do Dário e a Tia Ana. Em seguida, dispondo de tempo, fomos até o jundu, no Porto do Cáindo. E aí aconteceu uma boa surpresa: lá estava o Velho Oliveira.
                O Velho Oliveira agora está entre os caiçaras mais antigos do nosso povo. “Eu nasci em 18 de fevereiro de 1925”. Os da sua geração, ao menos nessa região, já se foram.  Meu avô (Zé Armiro) era um desses companheiros. Quantas vezes eu presenciei os dois nas puxadas de rede, nas prosas dos serões no jundu e nos roçados! Meu avô dizia que os dois estudaram juntos, quando crianças ainda. Agora, duas histórias vividas por eles e contadas por vovô:
                “Numa aula, no tempo em que na sala da casa do Tio João Bento servia de classe de ensino, a professora, após uma  explicação em torno da Pátria, de civismo e temas afins, perguntou ao Oliveira:
                - Oliveira, quem é a Pátria?
                - A Pátria é a nossa mãe, professora.
                - Muito bem, Oliveira!
                Percebendo que o Dito Silidônio estava distraído, olhando para um bando de periquitos no ingazeiro do terreiro, a professora repetiu a questão ao mesmo:
                - Silidônio: quem é a Pátria?
                - Esta é fácil, professora! A Pátria é a mãe do Oliveira!
                Naquele instante o Oliveira se voltou para o colega e disse muito bravo:
                - Você pare com isso, Dito Silidônio. Eu não admito que ninguém fale da minha mãe.
                E o bate-boca ainda rendeu uns tabefes a torto e direito. Coitada da professora”.
              A outra situação, segundo o meu avô, “aconteceu quando já eram adultos e carregavam um defunto para ser enterrado na cidade. Nesse tempo, devido ao avanço do mar, o cemitério da Praia Vermelha foi desativado. “Nas marés cheias a água começou a mostrar os ossos”. A solução era levar na rede o defunto ao cemitério do centro da cidade. Em ocasião assim, geralmente os carregadores se revezavam entre os cabos da madeira que sustentavam o falecido e um garrafão de cachaça. Só assim para cumprir tal tarefa.  Ao passar na entrada da cidade, depois de vencida a distância até o Morro da Berta, apareceu a casa do primeiro morador. E aí veio a pergunta:
              - Quem morreu?
              O Oliveira, que naquele momento revezava com o Dito Silidônio, respondeu:
              - Foi o Dito Silidônio, coitado! Era tão novo!
              Aí o defunto foi ao chão, e o Silidônio se atracando  aos berros com o Oliveira:
             - Eu não, seu filho da mãe. Não tá vendo que estou aqui, carregando o finado Tio Onofre?
             E mais uma vez os dois se estapearam enquanto os demais riam à vontade. Mas todos eram muito amigos e assim continuaram até nesses  dias”.

             Ah! Quantas recordações e como é bom escutar o Velho Oliveira!

Um comentário:

  1. Fico feliz em ouvir estas histórias e de saber que meu avô Solidonio fez parte destas histórias no seu blog.
    Parabéns por registrar para as gerações futuras.

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