segunda-feira, 26 de junho de 2023

AS PAREDES QUE ME DEVOLVERAM AO PASSADO

 

Joban e a parede - Arquivo Joban

Joban e professor José Wilson - Arquivo Joban

A minha turma - 1971 - Arquivo professora Valda


    Dias atrás o amigo João Batista Antunes, nativo da Enseada, me fez recordar da nossa escola no Perequê-mirim. São escritos assim que trazem, nos devolvem ao passado de crianças caiçaras que tiveram a oportunidade de estudar, de participar dos afazeres e de brincar livremente. Também nos faz recordar de Mestras e Mestres, geralmente provenientes de outras cidades para, em Ubatuba, exercerem o magistério e darem suas contribuições ao nosso ser caiçara, se casarem com caiçaras, deixarem registros importantes etc. Enfim, vamos à leitura de AS PAREDES QUE ME DEVOLVERAM AO PASSADO. (Que também poderia ser BOAS LEMBRANÇAS NUM PEDAÇO DE PAREDE). Gratidão, Joban!


        Quando menos se espera, o passado vem e nos atropela. Nos leva para a poeira da memória, traz de volta lembranças arquivadas pelo tempo. Vem visualmente, às vezes integralmente, às vezes em pequenos detalhes. Assim me senti quando sentado em uma lanchonete no meu bairro, eu vi as paredes dela, onde retiraram o reboco, mostrando os antigos tijolos da construção antiga. Voltei no tempo e vi que eram as paredes da minha escola primária. Me senti como se estivesse sentado na minha velha carteira carcomida pelo tempo. E vi meu velho professor me ensinando a escrever numa velha lousa negra. Seu giz caminhava pela lousa desenhando o saber. Letras se unindo formando palavras, números formando contas. A velha tabuada que eu tinha preguiça e dificuldade de decorar. Sete vezes nove, inquiria o professor; “será sessenta e um ou sessenta e três?” Com a mão já estendida para receber a palmatória, respondia errado: “sessenta e um”. Recebia o castigo, forma esdrúxulas e arcaica de violência para se ensinar, comum naquela época. Os risos dos colegas de classe eram mais doloridos que o castigo. Mas tinha a hora do recreio, onde eu saboreava o pão com ovo, ou peixe frito com farinha trazido de casa. Sempre repartia com aqueles que não tinham o que levar de merenda, também tinha o jogo de bolinha de gude. Bater corda para as meninas pularem no intuito de ver o que não nos cabia ver.

         Lembrei também de um fato pitoresco que aconteceu. No meio e no final do ano, vinha sempre um examinador da Secretaria Estadual de Educação, de Caraguatatuba, para avaliar o progresso das escolas. A secretaria avisava o dia e encaminhava dez perguntas a serem feitas aos alunos. Uma vez, as perguntas e o aviso da vinda do tal examinador, chegou com dois dias de antecedência, não dando tempo para o professor preparar os alunos. Por isso ele escreveu no caderno de dez alunos a resposta de cada pergunta, e quando o examinador fizesse a pergunta, quem tivesse a resposta levantaria a mão. Hugo que era o incumbido de responder sobre Tiradentes, estava nervoso e pediu ao professor para ir ao banheiro. Ele autorizou, mas recomendou que voltasse logo pro causa da chegada do examinador. Mal Hugo havia saído ele chegou e começou a fazer as perguntas. Cada um que tinha a resposta levantava a mão e respondia. Tudo ia dando certo até que o examinador pergunto: “Quem foi Tiradentes?” Joãozinho levantou a mão e o professor ficou surpreso porque era para Hugo levantar a mão. Ele talvez tenha esquecido que o aluno tinha ido ao banheiro. O Examinador voltou a perguntar quem era Tiradentes e Joãozinho respondeu: “Tiradentes foi ao banheiro”. A classe toda caiu na gargalhada e a escola ficou no vermelho.

        Todas essas lembranças explodiram em minha mente vendo aqueles pedaços de velhas paredes da minha escola, que hoje serviam de decoração para a lanchonete que funciona agora no lugar da minha velha escola. Me senti menino. As dores do velho corpo destruído pelo tempo se foram. Deu vontade de sair, correr como se estivesse perseguindo borboletas na volta para casa, depois da aula. Mas minha esposa me tirou do devaneio perguntando o que eu queria escolher para comer, e disse por que eu estava tão distraído. Eu respondi: “Aqui foi minha antiga escola, está vendo aqueles pedaços de velhas paredes? Eles me trouxeram velhas lembranças”. Ela me abraçou e disse: “Só quem aprende o significado do valor do ensino e da educação. consegue ver as lindas lembranças de sua escola em um pedaço de parede”.

12/06/20233 Joban Antunes

2 comentários:

  1. amei a reportagem sua, e a sugestão do nome, ficou muito bom , parabéns e obrigado, grande abraço Joban

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