domingo, 11 de setembro de 2022

OLHANDO O TEMPO

 

Cará roxo à mesa (Arquivo JRS)

Canoas e canoeiros (Arquivo JRS)

     Acabei de tomar café. Adivinha com quê? Isso mesmo! Com cará roxo! 

     Eu passei por outras terras, conheci alguns lugares e povos fora daqui, mas não encontrei desse cará por aí, nesses outros chãos. No inverno é a colheita dele, quando as tralhas secam nós já estamos de olho. A caiçarada, então, essa parentada nossa, logo parte com suas enxadas e recolhe as raízes tão cobiçadas. Depois... é só alegria na degustação. Os mais antigos falavam de uma variedade inteirinha roxa, tal como a batata coração magoado, mas eu não a conheci. Possivelmente, nos antigos eitos de roças há desse tesouro resistindo. Mas voltemos ao tema de hoje. Por enquanto eu olho o tempo. É dia de prova, de corrida de canoas na Barra Seca, um foco de resistência caiçara muito estimado por mim e meus familiares. Por isso a minha filha também está ansiosa para mais um evento da nossa cultura.

    Os eventos culturais estão sempre acontecendo pelos diversos pontos do nosso município de Ubatuba. Uma diversidade deles competem pela atenção e importância. Porém, têm alguns que não respeitam nem a natureza nem a comunidade. Querem que engulamos como maravilhas eventos que apenas fazem barulhos, deixam lixos e nada de bom acrescentam aos moradores do lugar. Quero parabenizar as associações que têm representatividade dos nativos da terra e que buscam valorizar/resgatar traços da cultura caiçara tão essenciais ao espírito de respeito ao meio ambiente. Sem dúvida que os remadores organizados, protagonistas do calendário dos eventos de canoagem, merecem nosso reconhecimento. Outros passos podem seguir esses festejos que começam com o acolhedor café caiçara. Exemplos: área de plantio de capurubu exclusivamente para trabalho dos mestres canoeiros. Até vislumbro um morro, tal como o do Saco da Mãe Maria, repleto desses exemplares da Mata Atlântica; ou o Rancho Caiçara com espaço permanentemente aberto aos artesãos do nosso lugar; ou os Pontos de Cultura semelhantes à iniciativa do primo Ostinho (Pedra Branca - Enseada) e da Mestra Laureana, no Prumirim. E como não reconhecer o papel dos velhos e jovens fandangueiros e fandangueiras, dos encontros ao longo do litoral, do imenso território caiçara no seu grito de AMANHEEEEEECE? 

    O que não deveria ocorrer é determinados eventos mais prejudiciais do que benéficos ao nosso povo tão fortemente marcado pela exploração, pelos mandatários enganadores. Gente que se encaixa nesse perfil está, na verdade, exterminando a nossa "galinha de ovos de ouro". Essas iniciativas nada louváveis avançam sobre a cultura local, desrespeitam e abrem mais espaços aos gananciosos, aos especuladores imobiliários que estão pouco se lixando pela natureza que tantas gerações de caiçaras conseguiram preservar.  Por enquanto eu olho o tempo e me preocupo com gente nossa ainda apoiando discursos de ódio de gente transvestida de patriotas, mas que entrega nossas riquezas ao estrangeiro. 

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