quinta-feira, 4 de agosto de 2022

UMA HISTORIA LINDA DE MORRER

Seo Antônio e Dona Benedita - Arquivo Rê
  

UMA HISTÓRIA LINDA DE MORRER

      Hoje arranjei um tempo, bem cedinho, para fazer esta postagem da amiga Regina, um emocionante texto por ocasião do falecimento do Tio Vitinho há poucos dias, em 21/7.

      Victor Fernandes da Silva (1936 – 2022), filho de  Seo  Antônio e Dona Benedita e irmão de Ana Maria e Odette (mãe da Rê), uma querida família migrante que abraçou Ubatuba desde o ano de 1959, se aposentou, após 37 anos de serviços prestados ao Estado. Foi um dos funcionários do DER que trabalhou na rodovia entre Ubatuba e Taubaté, porém nunca passou um dia sem se envolver em alguma atividade. Agora nos deixou.

   Quem eram Seo Antônio e Dona Benedita? Os pais de  Odette, Victor e Ana Maria, avós da Rê e de mais gente que nos honra exercitando a cidadania! Somente os caiçaras mais antigos se lembrarão daquele casal que morava na Prainha do Padre (ou do Matarazzo). Com eles eu tive o privilégio de tomar café algumas vezes e escutar suas histórias. Outro dia a gente fala mais dessa gente humilde e valorosa que contribui ainda hoje por intermédio de seus descendentes. Mas vamos ao texto!

 

Uma história linda de morrer

Um título intrigante, de um dos livros da Dra. Ana Cláudia Arantes  que  peço licença para utilizá-lo nesse pequeno depoimento.

 

Sim, já vinha me preparando para esse momento de partida, despedida, passagem de vida por assim dizer, mas vivi nessas últimas oito horas na manhã do dia 21 de julho de 2021, uma experiência como nenhuma outra.

Por dias aguentei firme sem derrubar se quer uma lágrima, insensibilidade minha? Jamais! Empatia? Não senão não conseguiria ajudá-lo. Compaixão?  sim. Pois esse sentimento nos permite ser útil na medida do possível. Mas quando o vi lutando de forma serena ainda que ofegante para encontrar forças sabe lá Deus de onde para continuar apenas respirando, pedi licença, me retirei e, confesso,  caí em pranto de um jeito que pude sentir meu coração naquele momento se derretendo em lágrimas. Então  deixei vir tudo o que estava guardado por dentro e por e fora. Depois respirei bem fundo por alguns minutos para tentar me recompor e voltei ao seu lado da minha mãe, tia e primas.

Quanta coragem presente naquele corpo já entregue a Deus, naquele corpo tão fragilizado por fora e tão doente por dentro. Ele dizia que já não sentia mais dor  nas últimas 24h, apenas  dizia que estava muito cansado... também pudera, pois cada vez que deitado pedia para senta-se,  tenho certeza que por estar já há dias sem comer ou beber,  era como se ele gastasse ali as poucas energias que ainda lhe restava. Ofegante, muito ofegante ele repetia: “Ai.... tô muito cansado....muito cansado...”. E sua respiração ficava cada vez mais curta... Mas em nenhum momento chegou a dizer " Meu Deus me leva! " . Que lição de vida ele me deixou! Obrigada! Porque você não me deu trabalho algum tio.

(Pausa....) Minhas lágrimas recomeçaram, pois ele esperou seu momento chegar, sem desespero algum,  aceitando todo o carinho, através do toque das nossas mãos, dos olhares  das cinco mulheres que se fizeram presente nessas últimas horas de sua vida. Suas duas irmãs a mais velha e a caçula e as três sobrinhas que lhe cercavam com abraços, beijos, carícias e uma enorme força espiritual do desejo que tínhamos  de não ter que vê-lo   fazendo tamanho esforço. Nosso desejo era o de poder oferecer-lhe um final com muita dignidade e respeito, o respeito que todo ser humano merece nesse momento.

Quanta presença de Deus pude sentir estando na presença dele. Seu silêncio se juntou ao nosso silêncio. Sua dor também foi a nossa dor e sua serenidade foi a mais impressionante que já vi e vivi na vida.

Antes que o levassem,  o abraçamos dizendo o quanto o amávamos. Tocávamos aquele corpo  tão seco e de tão magro que estava,  pois estava muito desidratado,  um  corpo que em vida quase não pode sentir o toque das mãos das pessoas por ser  ele uma pessoa  tão tímida, tão  reservada, muito embora gostasse de brincar com a gente as vezes.

Uma de suas sobrinhas ainda conseguiu lhe tirar um pequeno e tímido sorriso quando disse que ele tinha covinha no rosto. E foi  assim,  então, que aquele semblante deixou em nós a certeza de alguém que se fora em Paz e a certeza de alguém que foi muito amado pelas pessoas mais importantes de sua linda trajetória de vida. Esteja com os anjos a lhe rodear.

Se estamos fortes nesse momento, acreditem essa força não é nossa.

Valeu, Rê!


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