domingo, 13 de maio de 2018

UMA MISTURA


 
Nossa mãe (Arquivo JRS)













Nesta semana, para uma atividade escolar, me pediram se eu não poderia escrever algo sobre cambuci, a fruta. Pensei no reduto dos italianos, bairro do Cambuci, na capital paulista, onde mora o meu amigo Rui; lembrei-me de minha raízes culturais, da mamãe que fazia parte dos Scongelo, da praia da Fortaleza. Dei umas pitadas a mais na minha história e saiu esta história que eu dedico à memória da saudosa mãe, da Dona Laurentina.

               Há muito tempo, quando eu nem imaginava o que era cambuci, fui conhecer a cidade de São Paulo. Fiquei radiante! Imagine eu, cidadão do mato, de Ubatuba, desembarcando numa selva de concreto, com máquinas e carros de arregalar os olhos. Minha mãe chamou um táxi e disse: “Direto para o Cambuci, faz o favor”. Achei a palavra interessante porque rimava com o nosso macaco muriqui.
               Cambuci era o bairro onde moravam amigos de muito tempo da nossa família, do nosso lado italiano. Dizia a mamãe que os bisavós deles vieram no mesmo navio. Eram migrantes buscando outras condições para continuarem suas vidas. Tratava-se de amizade preservada pelas diversas famílias desde aquele tempo, quando quem governava o Brasil era um imperador velhinho bem barbudo. De tempos em tempos nossas famílias se visitavam nesse compromisso selado ainda na travessia do oceano Atlântico.
               Na casa onde fomos acolhidos havia um menino com a mesma idade que a minha. Logo parecíamos como irmãos. Criança é assim, né? O nome dele era Rui. Achei engraçado porque ele já usava óculos, cujas lentes fortes lhe davam olhos enormes. Quando lhe falei da minha curiosidade a respeito da palavra cambuci, ele assim me explicou: “Cambuci é uma fruta diferente. Agora, no fim do verão, a nossa árvore tá carregadinha. Vamos no quintal ver”. Chegando lá, ele já foi subindo numa escada que estava encostada por ali. Apanhou alguns frutos. Era diferente mesmo; não parecia com nada que eu conhecia. Na cozinha, a mãe do Rui, dona Giorgina, se dispôs imediatamente a nos fazer um suco. Achei gostoso, mas era um tanto que ácido e parecia grudar na garganta. Do outro jeito que ela fez mais tarde eu gostei mais: bateu com leite e mel. Desde essa ocasião essa combinação me traz ótimas lembranças do amigo Rui, da família dele e de tantas outras do bairro do Cambuci, na capital paulista.
               Na volta, trouxemos para Ubatuba um pacote de cambuci. Meu pai achou ótimo, colocou vários para curtir na pinga. Minha mãe fez geleia. Meu pai assim me explicou: “Cambuci é uma planta que quase foi extinta porque não é tão fácil a sua frágil semente germinar e crescer naturalmente. No nosso município nós temos poucas árvores. Tem esse nome porque a fruta se parece com um pote, como uma cambuca achatada. Sabe onde tem um bonito pé de cambuci, Zezinho? Lá no Morro da Anta, mais perto da Pedra da Igreja, no alto da Fortaleza, quase virando para a Lagoinha. Tente ir por lá no mês de abril para trazer umas frutas para nós”. Para finalizar: muitas mudas foram feitas a partir daqueles frutos.  Estão espalhadas por aí. Um cambucizeiro, ainda do tempo do meu finado pai, sobrevive no terreno da escola “Semíramis”, no Saco da Ribeira. Que ver? Vai lá!
               Viva o cambuci, de onde vem tantas coisas boas! Viva o Cambuci, lugar de tantas pessoas queridas! Viva o cambuci que hoje nos reuniu aqui! Viva! Viva! Viva!


Viva a minha Gal, mãe querida e exemplar da Maria Eugênia e do Estevan!

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