"Nesta gamboa morava um sapo que era um príncipe encantado" (Vô Estevan) |
Antigamente,
tenho quase certeza, escutávamos mais histórias. Em qualquer casa tinha alguém
que, ao final do dia, depois de todos lavados e alimentados, chamava a atenção
sobre si através de boas narrativas. Eram os nossos gostosos serões!
Os
meus avós, sobretudo Estevan (pai do papai) e Eugênia (mãe da mamãe), eram os
meus preferidos. Viriato Corrêa, no livro Cazuza, dá um destaque para Vovó
Candinha, a contadeira de histórias: “Ninguém no mundo contava melhor histórias
de fadas do que ela”.
Neste
momento, penso nas adaptações que os meus antigos fizeram de importantes contos
de fadas. Vovó Eugênia, por exemplo, dizia que João e Maria, os maltratados pela madastra, caíram em poder da
bruxa porque estavam em cima da cobertura de sapê da casa de farinha. Era de
onde, com uma vareta de bambu, roubavam o beiju que a velha preparava. Enquanto
os dois irmãos se saciavam, a culpa recaía num gata preta que por ali ficava. A
cada pedaço de beiju “pescado” pelos dois esfomeados, a bruxa ralhava com a
bichana: “Chip, chip, chip, minha gata, depois de cozido tu comerás!”. Demorou
muito tempo para eu ler a outra versão (da casa de chocolate, da densa floresta
etc.).
Já
para o vovô Estevan, em todas as histórias de contos de fadas, os pássaros tinham
presença obrigatória. E eram os mesmos da nossa terra! Eu ficava fascinado por
uma passagem onde o tié-sangue viajava muitas terras para ouvir e trazer para
nós as histórias de uma princesa aprisionada. Depois, daqui da beira da
costeira, saía um príncipe para salvá-la. Para esta tarefa usou canoa e andou
muito a pé, tal como faziam os caiçaras daquele tempo. E aquela gamboa, perto da casa do Tião Plácido me encantava. Vovô contou que dali tinha saído um príncipe-sapo.
As
palavras eram perfeitamente entendidas porque estavam no nosso contexto. Num
tom há muito familiar elas nos arrebatavam. Por fim, caindo de sono ou
carregados, estávamos nas nossas humildes camas de esteira ou colchão de capim
devidamente ornamentados com simples colchas de retalhos costuradas pela mamãe,
sem que faltasse os famosos cobertores “tomara que amanheça”.
Não
consigo imaginar quem não tivesse uma “Vovó
Candinha”!
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