quinta-feira, 19 de julho de 2012

NUM CAMINHO DE FLORES



Araçá vermelho: quem já experimentou? Mas eu prefiro o amarelo.

                A minha tia Aninha, mulher de grande simplicidade e sempre disposta nas tarefas inevitáveis da sobrevivência, em certa ocasião, mesmo adoentada, me recebeu, como de costume, muito acolhedora.

                Meio que sentada em sua cama, ela, com um semblante sereno, especulou por todos da nossa família, principalmente pela mamãe. Em seguida elencou as suas preocupações: uma galinha estava chocando na gamela da prensa, na casa de farinha; o mato em volta da casa e também no mandiocal precisava ser carpido. Nem se esqueceu da capela que necessitava de uma arrumação para a festa de junho que se aproximava.

                Ainda ela dizia as suas preocupações quando, no radinho sobre a mesa, uma música popular tradicional deu outro rumo à conversa. Comentou: “O importante numa canção é a beleza da letra e a melodia”. E continuou, agora de olhos fechados, como se falasse embalada pela composição:

                “Nesta noite passada eu tive um sonho bonito com o Maneco: ele estava daquele jeito  mesmo, ou seja, sempre ativo, atento a tudo, querendo tudo no lugar e implicando sempre com pouca coisa.

                Assim que me viu, me chamou para andar e ir ver uma coisa na roça. Eu fui sem falar nada, só reparando no caminho já conhecido com muitos tinhorões brilhantes e margaridinhas amarelas. Também reparei nas tinticuias floridas, parecendo uma colcha em rosa e branco por todo o morro. O velho pé de araçá vermelho estava carregado de frutas, se oferecendo para quem quisesse daquelas delícias.

                Não andamos muito, mas eu já estava cansada. Nisso o Maneco, mostrando a moita de guaco também florida e cheirosa, disse: ‘Lembra-se dela, Ana? Desde o nosso casamento ela está aí; foi o nosso remédio tantas vezes. Quero que você colha uma braçada de flores e leve-a para a nossa filha Nélia. É o remédio que ela precisa para ter paz em casa’.  Depois de dizer isso, ele se foi por um caminho todo florido. Eu voltei sozinha para casa; acordei agora mesmo. Nesta horinha!”.

                E nós continuamos a prosear quando alguém adentrou pela porta escancarada da cozinha. Era a prima Nélia, a sua filha. De lá mesmo ela exclamou:

                “Que ramalhete bonito e cheiroso de flores de guaco! Tá lindo no vaso! Quem foi que trouxe para a mamãe?”

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