quarta-feira, 21 de abril de 2021

A PENA POR UMA IDEIA

 

Selo cubano (Arquivo internet)

     Era o dia 21 de abril de 1792. Há duzentos e vinte e nove anos (229!), no Largo da Lampadosa, no Rio de Janeiro, na parte da manhã, Tiradentes foi enforcado após três anos de processo. Depois, seguindo ordem da rainha portuguesa (Dona Maria I, que mais  tarde enlouqueceu), teve o corpo esquartejado, salgado e espalhado em partes pelo Caminho Novo, que ligava O Rio de Janeiro a Vila Rica, onde ficou a cabeça exposta para desencorajar outros que ousavam sonhar pela independência do Brasil, pela liberdade.

     Charles Ribeirolles, um francês que ficou aqui entre 1858 e 1860, quando foi vitimado pela febre amarela, teve o capricho de transcrever, no livro Brasil Pitoresco - Volume 1,  o processo da Conjuração Mineira. Digamos que foi importante o que esse cidadão registrou para, muito tempo depois, Tiradentes virar herói e feriado nacional.  Eis um fragmento do texto:

   Condenam o réu Joaquim José da Silva Xavier, por alcunha de Tiradentes, alferes que foi da tropa paga da capitania de Minas, a que com baraço e pregão seja conduzido pelas ruas públicas ao lugar da forca, e nela morra morte natural para sempre, e que depois de morto lhe seja cortada a cabeça e levada à Vila Rica, onde em o lugar mais público dela seja pregada em um poste alto até que o tempo a consuma; o seu corpo será dividido em quatro partes e pregados em postes pelo caminho de Minas, o sítio da Varginha e de Cebolas, onde o réu teve as suas infames práticas, e os mais nos sítios de maiores povoações, até que o tempo também os consuma. Declaram ao réu infame, e infames seus filhos e netos, tendo-os, e seus bens aplicam para o fisco e a câmara real, e a casa em que vivia em Vila Rica  seja arrasada e salgada, e que nunca mais no chão se edifique, e não sendo próprias, serão avaliadas e pagas ao seu dono pelos bens confiscados, e no mesmo chão se levantará um padrão pelo qual se conserve em memória a infâmia deste abominável réu.

    A seguir, uma reflexão importante do autor relacionando com percurso similar ocorrido no território que é o atual Estados Unidos:

   Tiradentes foi publicamente executado no local hoje chamado praça da Constituição, junto à rua dos Ciganos. Como quisera a sentença, houve sinistro aparato na marcha para o suplício, e o cadafalso estava em grande gala.

   O mártir soube morrer. A multidão emocionada não viu passar um queixume, um temor, sobre essa fronte de soldado. É que ele se sacrificava por uma ideia.

  Agora, o que existia no fundo do processo? Tiradentes e seus companheiros seriam mesmo culpados? Sim. No direito legal que ligava as colônias às metrópoles, eles eram culpados como Washington, como Franklin, como Jean Hancok e outros rebeldes americanos do congresso de Filadélfia. Se lorde Gage, general do exército inglês, tivesse esmagado, desde as primeiras campanhas, as milícias revoltadas da América do Norte, o que seria de George Washington? Talvez mortos como Tiradentes, no alto de um cadafalso. Seus bens teriam sido confiscados, seus membros dilacerados, sua casa arrasada, seus filhos e netos aviltados e execrados. Mas a guerra lhe foi favorável, e hoje Washington é herói.

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