Fazendo balaios (Arquivo JRS) |
Mais um Momento Literário dentre tantos outros que vivemos e ainda esperamos viver enquanto houver vida. Tudo começou de forma gratuita, na família, com as histórias narradas por nossa mãe, por nosso pai. Quem não viveu aqueles momentos noturnos, quando a imaginação corria solta ouvindo as aventuras, os medos e as alegrias que nos introduziam no sono e nos sonhos? Tudo era gratuito! Que viagem! Quantas viagens!? Nem um tostão se gastava. "Os tempos são outros", ouço repetidamente. E daí? As coisas podem se modificar, evoluir ou regredir, mas as pessoas são as mesmas, permanecem na mesma espécie sapiens!
O derradeiro tema, por sugestão de tanta gente boa, foi em torno de lendas, um dos gêneros literários que gostamos muito. Na verdade, muitas dos nossos primeiros encantamentos literários provém de lendas. Mas de onde vem esta palavra? Por isso parti da etimologia, da origem do termo.
Lenda deriva do latim, a raiz da nossa língua portuguesa e de outras mais. Legenda deu origem à palavra lenda. Significa, literalmente, "a serem lidos", de legere "ler". Era hábito nos mosteiros, sobretudo durante as refeições, alguém ficar lendo, de um púlpito, aos demais. Eram narrativas sobre as vidas dos mártires, dos santos, dos momentos significativos à vida da Igreja Católica. Esse conjunto de histórias se agruparam no livro de Jacopo de Varazze, Legenda Áurea, do século XIII. São mais de mil páginas a cultivar um desejo pelo maravilhoso, pelo paraíso prometido. Encurtando a prosa: de legenda vem lenda.
Livro nosso (Arquivo JRS) |
Quem nunca ouviu uma lenda? Elas fazem parte do repertório de histórias populares de uma determinada sociedade; são repassadas oralmente pelas gerações; também servem de base na evolução do processo civilizatório, querem passar uma moral, um preceito, uma advertência etc. Por exemplo, quando vovó nos contava a lenda da Gruta que chora, estava reforçando a ação do padre que livrara a comunidade da serpente, do dragão que apavorava aquela gente. Seria legenda caso estivéssemos na Idade Média, a ser lida; agora se vestia de lenda contada por nossos saudosos entes queridos.
Assim como quase tudo que ouvimos e lemos, podemos notar nas lendas resquícios de narrativas mais antigas, dos primórdios. Muitas vezes ainda são preservados até mesmos os nomes antigos, de tempos que nem se sabe, de fronteiras além da Ameríndia. Ou seja, se vestem com novas roupagens, mas continuam sendo essenciais a uma espécie que permanece: a nossa, sapiens.
As lendas são construções coletivas que seguem ganhando novos significados conforme a comunidade vai passando por transformações. Ao ouvir uma lenda, logo quero saber a razão dela. Porém, me encanta mesmo é imaginar a trajetória feita por ela e me emocionar pelo conjunto. Aquelas que ficaram no papel, quando alguém quer jogar fora, eu as transformo em balaios, um saber caiçara aprendido enquanto ouvia histórias.
Gratidão ao pessoal que participou de mais um Momento Literário.
Em tempo: mitômano é o hábito patológico de mentir. Ou seja, é doença de quem não consegue viver sem mentir.
Querido amigo, grande e muito significativo esse momento em que você nos permite conhecer um pouco mais de suas/ nossas histórias. Gratidão imensa
ResponderExcluir