Caiçaras em desfile folclórico - Arquivo JRS |
Não tem como não se encantar com o Pico do Corcovado, em Ubatuba. Dizem os geógrafos que é o segundo mais alto do município. O primeiro, do Alto Grande, está na divisa com o município de Cunha. Muitas histórias os caiçaras contam desses lugares, sobretudo do Corcovado, essa imensa pedra aflorada na Serra do Mar, tão perto de nós, onde antigamente só caçadores visitavam. Hoje é ponto turístico, com grupos organizados enfrentando sua subida e nos proporcionando fantásticas imagens lá do alto. É do Corcovado que vem a história de hoje, parte do nosso folclore.
Contavam os mais antigos que, no tempo em que Portugal mandava em tudo, um fazendeiro português, traficante de negros escravizados, se instalou no Sertão do Corcovado, por onde enviava ao Vale do Paraíba as vergonhosas cargas de homens tornados mercadorias. Esse homem tinha uma linda filha em idade de casamento. Assim que instalou o engenho de cana, apareceu por ali um jovem fidalgo na pretensão de agradar a moça, de se casar com ela. Só que o pai, um homem terrível, era contrário ao namoro entre os dois. Por isso teve a atitude de encerrar a filha na mais recôndita alcova da casa, sob severa vigilância. Por sorte, um escravizado de confiança, servidor da casa, se prestou a manter a comunicação entre os jovens apaixonados. Disso resultou um combinado: eles fugiriam numa madrugada, em direção ao Morro (Pico) do Corcovado, onde o fiel servidor, por nome de Tiago, lá já estaria esperando desde o dia anterior, com as jóias pessoais da patroazinha e com alforges de alimentos. Mas a sua missão maior era auxiliá-los na caminhada pela mata até encontrarem um lugar seguro, longe do terrível pai. Só que o plano foi descoberto. O moço foi assassinado numa tocaia e a moça foi enviada no primeiro navio que partia para a capital do reino português, de onde ninguém mais soube notícias. O velho morreu de velho depois de tantas maldades. E o escravo Tiago? Contavam os antigos caiçaras que ele continuava lá, na grande pedra do Corcovado, esperando os fugitivos e assombrando os caçadores que se aventuram em se aproximar do local. O primo Rogé me garantiu que, numa de suas caçadas, ele divisou o homem. "O escravo que aguardava a sinhazinha até hoje vive por lá, estava em cima da pedra. E tem mais, Zezinho: vez ou outra tem gente subindo tudo aquilo para ver se encontra as jóias que o coitado levou naquela ocasião. Veja só do que a ambição é capaz!".
Eu, partindo dessa história, proporia que o Pico do Corcovado passasse a se chamar Morro do fiel Tiago.
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