segunda-feira, 25 de outubro de 2021

ARQUIVO LARGADO NA MESA

 




Fotografia do Olympio - Arquivo JRS


       "Papai largou umas fotografias sobre a mesa, na área de trabalho. Nossa! Que legal!". Parei ali não sei por quanto tempo. Me detive demoradamente em cada uma daquelas imagens. Sei que são caiçaras; creio que todos os lugares e as pessoas são do lado norte de Ubatuba, do tempo em que nem existia a rodovia BR 101, a Rio-Santos.  

       Eu adoro fotografias - também! Imagino a concentração  de quem fez tal registro, as razões para esse ou aquele ângulo, as escolhas para captar o conjunto da imagem etc. Mas anseio mesmo é entender sobre a temática, aquela que revela muito de quem realizou o ato, produziu a obra de arte, as obras de artes.

       Olympio veio de longe, da capital paulista. Movido pelo desafio da linguística, se embrenhou por lugares distantes do centro da cidade, aos sertões e praias que pareciam ter um falar diferente, com muitas palavras arcaicas da língua portuguesa, do povo originário Tupinambá e dos negros escravizados. Conforme expressão dele mesmo, "a linguagem de vocês caiçaras é quase outra linguagem". Munido de gravador, máquina fotográfica, caderno, caneta e lápis, ele partia na maior disposição, inclusive para enfrentar os mosquitos que faziam de tudo para que ele  desistisse  da  pesquisa  ligada  à  Universidade  de  São  Paulo - USP -, no começo da década de 1970, se estendendo por vários anos até a conclusão, a apresentação e aprovação da tese acadêmica em 1978: O léxico do falar caiçara de Ubatumirim.

      O portentoso trabalho só foi o que foi, só resultou no que é, porque o território em questão ainda era isolado, com poucas influências migratórias. Hoje, o nosso lugar cresceu. A luta pela sobrevivência fez muita gente vir em direção ao litoral norte paulista, em busca de mais oportunidades. Desde que os primeiros portugueses aqui chegaram, no século XVI, as portas estão abertas para quem mais vier. Me atendo às fotografias espalhadas sobre a mesa, não tem como não concordar com alguém que disse um dia isto: "Toda pessoa que passa por nossa vida leva um pouco de nós e deixa um pouco de si mesmo". 

 
    

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